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Moradores do Alemão, Jacarezinho e Manguinhos contabilizam danos após chuva da última terça (7); Saiba como ajudar

Depois da forte chuva que atingiu o Rio de Janeiro, moradores tiraram o dia seguinte para limpeza, organização e cálculo de prejuízos
Pilhas de lixo se acumulavam no Jacarezinho (Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades)

A chuva que caiu no Rio de Janeiro na última terça-feira (7) pegou a todos de surpresa. Parecia que seria passageira, mas ganhou muita força nas horas que seguiram. Pelas redes sociais, a população de toda a cidade do Rio de Janeiro registrava como a chuva impactava em ruas e avenidas, mas o maior impacto foi nas comunidades, que sofreram com as perdas de seus bens materiais. O Voz das Comunidades passou por algumas localidades e registrou escombros.

Complexo do Alemão

A Fazendinha foi um local muito afetado pela chuva. A rua Antonio Austregésilo virou, de fato, um rio. Há muitas oficinas de moto no comércio da região e muitos mecânicos perderam peças e quase perderam as motos de clientes que foram arrastadas pela correnteza.

Gabriel Alcides, 26 anos, é dono de uma das oficinas da rua Austregésilo. Ele contou que durante a chuva, a água estava na altura do joelho. “Foi rápido. De repente, a água já estava no joelho. E foi levando moto, levando peça, levando tudo.”

Gabriel se concentrava na limpeza da oficina enquanto calculava o prejuízo. (Foto: Rafael Costa / Voz das Comunidades)

Bruno Souza, 23 anos, também é mecânico em uma oficina descendo a rua. Assim como o seu vizinho, ele limpava a oficina que contabilizava o que foi e o que quase foi levado pela correnteza. “Essa chuva levou várias motos e umas chaves nossas. Estamos tentando ver se essa chuva pára pra gente trabalhar tranquilo.” Ele conta que na hora, a correria foi grande. “Foi um puxa moto pra lá, puxa moto pra cá, leva uma, leva ferramenta.

Josemar Rodrigues Santos, de 68 anos, também morador da Fazendinha, disse que chuva entrou na sua casa. “Entrou por cima do guarda roupa. Tive que puxar uma telha na hora pra parar a água. Mas ainda assim molhou minhas roupas.”

Quando passamos pelo local, a rua estava com muito lixo, que desceu o morro com a correnteza. Os moradores e comerciantes lavavam e varriam as calçadas e fachadas de suas casas e estabelecimentos. Conforme relatos, até uma kombi abandonada no local andou alguns metros com a força do rio que tinha se formado. Ela também serviu de obstáculo para motos que foram arrastadas pelas chuvas. “Foi bem tenso na rua, mas ninguém se machucou”, relatou uma comerciante local à nossa equipe.

Manguinhos

A chuva em Manguinhos foi tão intensa a ponto de transbordar o Rio Manguinhos, que corta a comunidade. Na manhã desta terça-feira, a rua Leopoldo Bulhões, onde fica estação de trem, equipes da Comlurb trabalhavam para limpar o lixo espalhado pela pista. O rio transbordou e deixou a comunidade, que é plana, praticamente embaixo d’água. Conforme informações de moradores, uma dona de casa, mãe de cinco criança teve a casa invadida pela água do rio. A A articuladora social e estudante Jessica Lene organizou uma campanha de arrecadação para compra de materiais de limpeza para amenizar o impacto que as famílias de Manguinhos passaram.

Dentro da comunidade, o cenário também parecia de guerra. Pilhas de lixo se aglomeravam nas ruas, becos e espaços abertos. Enquanto limpavam, moradores contabilizavam os prejuízos.

Jacarezinho

O Jacarezinho também foi uma comunidade muito afetada pela chuva, principalmente os moradores da região conhecida como Areal. Ali, o que separa o Rua do Rio da Rua Guanabara é o Rio Jacaré. E foi exatamente esse transbordou e pegou os moradores de surpresa. A água invadiu casas e deixou muitas pessoas no prejuízo, inclusive pessoas com água no pescoço dentro de suas próprias casas. O lixo acumulado nas duas ruas mostrava o quanto que os moradores tiveram que se desfazer de móveis que foram deteriorados pela água. Muitas pessoas usavam mangueiras, baldes, rodos e panos para limpar o interior de suas casas, tomadas por barro que restou da cheia do rio. Simultaneamente, assistentes sociais da prefeitura cadastravam pessoas que tinham perdido móveis, equipes da Comlurb limpavam o local e líderes comunitários e articuladores organizavam e distribuiam doações que chegavam.


Sandirlei dos Santos é presidente da Associação de Moradores do Areal há um mês e se deparou com esse susto dentro da comunidade. “A gente encontrou uma situação bem crítica, com famílias muito necessitadas. Toda a ajuda é bem vinda. Seja com mantimentos, alimentos, ajuda psicológica… Tudo. Chegamos num patamar de ambiente de guerra. A gente pede ajuda para outras comunidades para ver como lidar com um caso deste tipo. Nesse local, esse tipo de ocorrencia é muito frequente, mas não como foi dessa vez. Foi muito crítico.”

“Descaso. É mais uma vez que a comunidade sofre com esse descaso do poder público”, defendeu Tino da Rocha, articulador social no Jacarezinho. “Você vê na fila da assistencia social que tem idosos, pessoas com deficiencia, gestantes… São pessoas que não tem certeza do que vão dar de janta para os seus filhos e netos porque perderam tudo. Não tem geladeira, não tem fogão. Não tem nada. O Estado precisa agir mais em prol da população do Jacarezinho. Não com poder bélico. Não são armas. Essas pessoas precisam de assistencia de fato.”

Mais para dentro do Jacarezinho, próxima ao Posto de Saúde Dr. Renato Rocco, na região conhecida como Favelinha da Xuxa, alguns moradores perderam só não seus bens e móveis como até aposentos inteiros de suas casas. Casas de madeira se estendem por um braço do Rio Jacaré por ali moram cerca de 40 famílias. Luis Henrique, 36 anos, trabalha como catador de resíduos e relatou que “ontem foi horrível o que aconteceu aqui. A água chegou bem próximo da minha cama. Só deu tempo de eu pegar o botijão de gás e puxar pra cá. O meu fogão foi levado pela água.”

Luis Henrique também mostrou que a chuva e água do rio quase levou o seu banheiro
(Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades)

Ele contou à equipe do Voz das Comunidades que só deu tempo salvar a sua certidão de nascimento. “O resto eu perdi tudo. Eu moro aqui tem três anos e não tenho para onde ir. O vizinho me deu um pouco de pregos para ajeitar o banheiro. A minha varanda também quase foi inteira com o rio”.

Grávida de oito meses do seu quarto filho, Jane Graciele de 26 anos, falou que foi um susto grande. “Só deu tempo de pegar minhas crianças, meus documentos e sair”. Ela relatou que dormia na hora da chuva e foi acordada por uma das filhas. “Ela veio aqui e disse ‘mãe, levaram o tapete’. Perguntei quem que tinha levado e ela respondeu ‘o rio’. Foi aí que eu vi que a água tava dentro de casa”.

Jane Graciele teve ajuda dos vizinhos ao sair de casa na hora da chuva
(Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades)

Moradora do local há 6 anos, ela disse que nem reclama muito porque já testemunhou coisas piores. Questionanda como será o futuro depois da chuva forte, ela responde que “agora é batalhar pra correr atrás de tudo de novo.”

Ao final da entrevista, a equipe desejou à Jane que as coisas dessem certo para ela.

“Já deu certo”

Resposta de Jane Graciele, olhando e abraçando a filha que a acordou durante a chuva.

Cidade Integrada

Em janeiro, o Cidade Integrada, programa de incursão na comunidade do Jacarezinho do então governador Cláudio Castro, completou 1 ano. Marcado muito mais por conflitos e desavenças do que avanços, já foram gastos mais de R$ 333 milhões de reais no programa. A comunidade do Jacarezinho ainda aguarda por melhorias prometidas pelo governo do estado, como programas sociais, melhorias de infraestrutura e moradia. Mas diante do cenário que se encontra o Jacarezinho, estas promessas vão demorar para sair do papel.


Texto: Rafael Costa
Fotos Jacarezinho: Selma Souza / Voz das Comunidades
Fotos Manguinhos: Jessica Lene
Fotos Fazendinha – Complexo do Alemão: Rafael Costa
Produção: Renato Moura, Rafael Costa, Jessica Lene, Gustavo Eduardo

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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