Voz em verso #04: O Estado do pecado – Cotta

O quarto convidado é o poeta Cotta, de 21 anos, criador do Slam Paz em Guerra e Slam Quarentena

A pandemia do Covid-19 mudou o jeito de viver de toda a população e muitos costumes foram deixados de lado. Entretanto, a produção de arte segue a todo vapor nas favelas do Rio de Janeiro e, através da coluna Voz em verso, traremos poesias de artistas da favela aos domingos.

Para a quarta semana da coluna, um poeta de São Gonçalo, criador do Slam Paz em Guerra, o Cotta, de 21 anos. Poeta e Slammaster (apresentador), Cotta também fundou o Slam Quarentena, a primeira batalha de poesias por lives do Brasil. Desde 2017 vive intensamente a poesia falada e já participou do Slam RJ, na final do Círculo Palavra Líquida. Além disso, representou o estado no Campeonato Nacional de poesia em dupla e trabalha com intervenções/oficinas em escolas e faculdades.

Voz em verso #03: Corre menina – Sabrina Azevedo

Aí você endinheirado
Você mesmo

Eu sei seu segredo
Realmente você não despreza a favela
Ninguém ignora aquilo que tem medo
Isso é a lei da selva
E o animal só me ataca
Porque se sente amassado
Vamos tomar topo da cadeia alimentar

Pode me chamar de favelado
Eu não importo
Eu não ligo

Suas pernas tremem vendo um menó
Portando um livro
Aah… mas tu não se livrou

Vamos trabalhando
que ninguém dá nada de presente
Meu futuro vai ser regado
Porque eu não arrego no presente

Os menó de favela agora tão tudo com ambição
Me falaram que tudo é passageiro
Quis ser o dono do busão
O gueto é bug
Pena que as vezes não é Notorius
Qual foi tiuzão
“Na cara não pra não estragar o velório “

Situação tá grave
Minha voz tá rouca
Os meus menó tão virando comida do sistema
E eles tão indo pra boca

A cada mordida
Percebo que não existe amor de dá
Somente amor de receber
Mas se ninguém quer amar
Amor ninguém pode ter

Mas amor pra quê?
Se o que importa é o plaque

Koe Cotta
tá falando de amor
Essa porra não ganha Slam
Se tu tá apaixonado deixa isso pra amanhã
Fale de luta
Fale de militância
Mande alguém tomar no cu com total ignorância

Koe irmão
Tenta me entender
Não faço isso por Tiete
Faço pra vocês não virarem o Tietê

É pra os menó parar e pensar
Se tiver na vida do crime sair de lá lá
Isso é papo de lelé
Vai virar estatística ou ter que pedir pra cantar Lili
A vida é muito mais que pra o baile usar loló
Ou arranjar uma novinha pra botar o lulu

Não tô falando de santos
Até porque por aqui só se for time de futebol
Tá alto preço do etanol
Perderam a linha não tem cerol
Mas pra o estado não falta gás pra cortar a luz que há debaixo do Sol
A luz somos nós!

Me diz pra quê pena de morte?
Se por aqui matam sem pena
Aliás quem tem pena é galinha
E todos querem cantar de galo
Gente barata se vendendo pra os estão de terno caro

RJ o estado do pecado
Temos Cristo Redentor
Mas aqui quem manda é o Diabo
Pela manhã a mãe clama pelo seu filho
A noite ele vai ralo
E lá se voltando da igreja mais um filho do Senhor
Poooou
imagina…
Se fosse o filho do senhor?

nunca é confundido né
Filho de doutor
Zona oeste tá o inferno
Zona sul tá o céu
Sabe como que é os Playboy nunca vão pra “réu “

Pra uns é bala na cara
Pra os outros é balada cara

De tanta bala nosso povo enjoou de doce
E hoje a pista tá salgada.

O Estado do pecado – Cotta

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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