Jéssica da Silva, de 33 anos, convive com paralisia cerebral e microcefalia. Sua mãe, Vera Lúcia, de 61 anos, relata os desafios enfrentados pela filha durante as frequentes quedas de energia elétrica no Morro da Babilônia, situado no Leme, Zona Sul do Rio de Janeiro, onde vivem desde sempre. “Ela fica extremamente irritada por não entender o que está acontecendo”, conta. Além disso, o calor intenso do Rio de Janeiro agrava as dificuldades. A locomoção dentro de casa se torna mais complicada, a televisão — sua principal distração — deixa de ser uma opção, e até mesmo os banhos, que Jéssica tanto gosta para se refrescar, são prejudicados pela falta de luz e suas limitações de mobilidade.
Diante dessa realidade, a casa delas foi escolhida para receber um projeto-piloto que visa criar um corredor humanitário de energia solar, conectando o alto do morro à quadra esportiva localizada na parte mais baixa. A moradia da família de Jéssica será readaptada para receber um sistema híbrido – energia solar com bateria própria – e será lançado em fevereiro deste ano, com previsão de conclusão em seis meses. A ideia partiu da ONG Revolusolar, que nasceu na Babilônia em 2015 e, em 2021, criou a primeira cooperativa de energia solar em favelas do Brasil, a Cooperativa Percília e Lúcio, composta por moradores do território. Há oito painéis de energia solar distribuídos em espaços públicos da favela do Leme.
O presidente da cooperativa, Dinei Medina, explica a importância de um corredor humanitário no morro. “Quando faltar energia, o caminho da casa da Jéssica até a Quadra da Babilônia vai estar iluminado. A quadra é o lugar mais seguro em questão de chuvas, por exemplo. A gente sabe que vai faltar luz, vão ter vários apagões por conta desses eventos climáticos extremos, então vamos deixar esses caminhos iluminados pensando principalmente nos idosos e nos moradores com questões psíquicas”, conta. “É importante a gente imaginar que esse projeto seja um modelo para o poder público.”
O projeto de energia mais acessível representa uma esperança para Vera Lúcia. “Para mim, eu penso na questão da conta mais baixa que eu possa pagar. Eu acho que esse projeto vai facilitar muito, inclusive a locomoção. No caso, não só da Jéssica, como das pessoas idosas ou pessoas que passam mal, principalmente quem sofre com convulsão. O corredor humanitário vai facilitar demais, porque vai estar claro, e vamos poder nos locomover mais rápido em situações de urgência”, explica a mãe da Jéssica.
Quando Vera foi apresentada à proposta do projeto, enxergou um impacto que poderia ir além de sua filha. “Quando ele veio com essa proposta, eu falei que gostaria que essa proposta beneficiasse não só a Jéssica, mas se tornasse algo grande para beneficiar outras pessoas que passam pelo mesmo. A gente que mora em comunidade sabe que é muita dificuldade. Aqui a gente não tem uma facilidade como um bondinho, só temos escada. A escada tem que estar iluminada”, destaca.
A falta de iluminação já trouxe consequências graves para Jéssica, que tem dificuldades de equilíbrio. “A Jéssica não tem equilíbrio, ela cai. E olha que estava com luz, imagine sem. Foi uma queda grande, quebrou dois dentes”, relembra Vera. A mãe também ressalta a confiança que sente na cooperativa que administra o projeto, formada por moradores do próprio Morro da Babilônia. “Ela se sente mais segura, inclusive pelo fato de a cooperativa ser do morro, com pessoas conhecidas e de confiança”, afirma.