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SLAM BR 2018: Mais um capítulo da revolução falada

Multidão reunida durante vários dias para recitar e escutar poesia? Parece improvável que eu esteja falando de algo real mas é exatamente isso que acontece no Campeonato Brasileiro de Poesia Falada, conhecido como Slam BR, que teve mais uma de suas edições em dezembro de 2018.

Slam no Brasil: um breve histórico

A origem do slam, competição de poesia falada com poesias autorais, em geral recitadas em até 3 minutos e sem uso de objetos cênicos, batidas musicais e figurinos, se deu em Chicago, nos Estados Unidos, na década de 1980 por Marc Smith. A chegada no Brasil foi em 2008 pela Roberta Estrela D’alva a partir da criação do ZAP! (Zona Autônoma da Palavra), realizado na então sede do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos Teatro Hip-Hop, no bairro da Pompeia, em São Paulo, demolido em 2014 pelas consequências da especulação imobiliária paulista. Isso não impediu, no entanto, que o ZAP! continuasse a  ser realizado.

Em 2011, Roberta Estrela D’alva representou o Brasil na Copa do Mundo de Slam em Paris, na França, por meio de seleção por vídeos e materiais enviados à organização do campeonato mundial. Em 2012, Fabio Boca, campeão do ZAP! em 2011, representou o Brasil em Paris. Em 2012 e em 2013, passou a haver um Campeonato Estadual em São Paulo (Slam SP) por conta do aumento da quantidade de slams no estado. Em 2012, quem venceu foi Lews Barbosa e em 2013, Emerson Alcalde, co-fundador do Slam da Guilhermina, o primeiro slam do Brasil a ser realizado na rua. Dessa forma, ambos foram para a Copa do Mundo de Slam em 2013 e em 2014, respectivamente.

Em 2014, por conta do surgimento de slams em outros estados, como Rio de Janeiro e Minas Gerais, o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos criou o Slam BR e, quando os estados passaram a ter seus campeonatos estaduais, passou a funcionar assim: cada estado realiza seus slams que classificam poetas para os campeonatos estaduais locais; dos campeonatos estaduais sai um ou mais poetas classificados para o Slam BR. Quem vence o Slam BR representa o Brasil na Copa do Mundo de Poesia Falada, realizada na França. O primeiro campeão do Slam BR, em 2014, foi mineiro João Paiva, e em 2015 foi a vez do poeta paulista Lucas Afonso; ambos representaram o Brasil na França em 2015 e em 2016, respectivamente. 2016 e 2017 foram anos de destaque das mulheres no Slam BR: Luz Ribeiro, de São Paulo (2016) e Bell Puã, de Pernambuco (2017) levaram o título de campeãs nacionais de poesia falada e representaram o Brasil na França.

Até o momento, o Slam BR é realizado em São Paulo por ser organizado pelo Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, que não só organiza o evento como arca com despesas de passagem e estadia para poetas e também com gastos relacionados à viagem do vencedor do Campeonato Brasileiro para a Copa do Mundo de Poesia Falada.

Como é possível notar, o crescimento do slam no Brasil não parou desde a sua chegada em 2008 e o Slam BR de 2018 foi mais que especial por comemorar os 10 anos da chegada do slam em terras canarinhas. As minorias foram completamente conquistadas pela cultura do slam e sem dúvida esses eventos auxiliam no processo de democratização da poesia e possuem, hoje, uma posição central na ampliação da representatividade das comunidades marginalizadas no cenário poético mundial.

Assista ao filme “Slam: Voz de Levante” para conhecer um pouco mais sobre o slam e sua chegada no Brasil.

Sobre o Slam BR 2018

Entre 12 e 16 de dezembro de 2018, essa que já é a maior Competição Nacional de Poesia Falada da América Latina reuniu em São Paulo, no SESC Pinheiros, poetas e admiradores de poesia falada de todo o Brasil. Poetas do Sul, do Sudeste, do Nordeste, Centro-Oeste e Norte do país estavam classificados para o Slam BR 2018, mostrando que já há slams em todas as regiões do país.

W-Black, organizador do Slam Vila Isabel abraçando Sabrina Azevedo, que chegou à semifinal do Slam BR representando o Slam Vila Isabel
W-Black, organizador do Slam Vila Isabel abraçando Sabrina Azevedo, que chegou à semifinal do Slam BR representando o Slam Vila Isabel

Eu estive em 2018 no Slam BR pela primeira vez para prestigiar o evento e, especialmente, para torcer pelos poetas do Rio de Janeiro: Sabrina Azevedo (que representou o Slam Vila Isabel), 4-Ó (que representou o SlamX) e Dudu Neves (que representou o Slam Laje), todos do coletivo NósdaRUA e que foram campeões do Slam RJ 2018, Campeonato Estadual de Poesia Falada do Rio de Janeiro. Fui e voltei para São Paulo de ônibus usando ID Jovem (você, jovem de baixa renda que não conhece esse benefício, experimente!), o que me garantiu gratuidade nas passagens de ida e volta e só tive que pagar um valor de taxas, que não chegou nem perto do que seria o valor de uma só passagem de ida para São Paulo. Saí da Rodoviária Novo Rio às 23h45 da noite do dia 13 de dezembro e cheguei no dia 14 de dezembro por volta das 6 da manhã na Rodoviária do Tietê, em São Paulo. A hospedagem foi garantida pelo aplicativo Airbnb, em que pessoas disponibilizam suas moradias ou parte delas para aluguel, saindo por um valor, em média, mais barato do que pagar hotel ou pousada no estado de destino.

No mesmo dia 14 fui ao Slam BR e já cheguei sabendo que Dudu Neves estava classificado para a semifinal e vendo Sabrina Azevedo e 4-Ó também se classificarem. A semifinal foi no dia seguinte e tive a alegria de ver de perto o 4-Ó ser classificado para a grande final do Slam BR 2018, em meio a abraços, choros e muita alegria do público e poetas presentes, principalmente os do Rio de Janeiro.

4-Ó, do Rio de Janeiro, sendo abraçado no momento em que chegou à grande final do Slam BRFoto_ Equipe Slam BR
4-Ó, do Rio de Janeiro, sendo abraçado no momento em que chegou à grande final do Slam BRFoto_ Equipe Slam BR

Não pude ir na final, pois o meu ônibus saía da Rodoviária do Tietê às 21h15 no mesmo dia de sua realização (16 de dezembro), mas acompanhei até onde pude a final pela live no Facebook, realizada pela equipe de produção do Slam BR em sua página oficial. E depois soube que a grande campeã foi a poeta Pieta, de Minas Gerais, mantendo a sequência de destaque das mulheres negras no topo do pódio do Slam BR desde 2016. 4-Ó, do Rio de Janeiro, conquistou a quarta colocação, a melhor posição em ranking no Slam BR já conquistada por um poeta do Rio de Janeiro na história do Campeonato Nacional.

Campeã Pieta no momento em que venceu o Slam BR. Foto_ Equipe Slam BR
Campeã Pieta no momento em que venceu o Slam BR. Foto_ Equipe Slam BR

Retornei para casa com a sensação de que o Brasil está conhecendo cada vez mais a cultura da poesia falada e que o slam, que já totaliza 149 no país segundo mapeamento do Slam BR, tem sido essencial nesse processo que é fundamental para o resgate da oralidade, relembrando os Griots, a contação de histórias pela via das palavras faladas dos mais velhos para os mais novos em África.

Se interessou? Procure um slam mais perto de você e participe da construção dessa história, que em pouco tempo tem mudado muitas vidas para melhor a partir do estímulo a processos de autoconhecimento, empoderamento individual e coletivo.

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Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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