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Perigosa Obsessão

Nas relações interpessoais, como em quase tudo na vida, o limite entre o que é saudável e o que é doentio está na intensidade. A relação entre fã e ídolo, como a de marido e mulher ou a de mãe e filho, costuma ser belíssima. Exceto quando a linha do equilíbrio é ultrapassada.

No último sábado, um fã obsessivo, do alto de sua compulsão pela belíssima Ana Hickmann, foi o responsável por uma tarde trágica. Apesar de ter sido muito noticiado, um resumo do que aconteceu: o jovem admirador da apresentadora se hospedou no mesmo hotel que ela, e, armado, fez reféns, além dela, seu cunhado e sua assessora. Num momento de particular descontrole, disparou contra a assessora de Ana, que terminou no hospital; nesse momento, em legítima defesa, o cunhado entrou em luta corporal com o sujeito, que terminou morto ao final do episódio.

Primeiro, é preciso diferenciar esse sujeito problemático dos fãs em geral: ele era, claramente, problemático, portador de algum tipo de distúrbio psiquiátrico. Segundo relatos, ele mandava mensagens de cunho pornográfico nas redes sociais da famosa, o que só cristaliza a ideia de que a “paixão” que ele nutria por ela era doentia; era algum tipo de compulsão, que, como o desfecho da situação confirmou, não fazia bem. Geralmente, fãs nutrem por seus ídolos um sentimento de admiração e tem neles um exemplo de vida, um espelho do que sonham em ser ou de quem querem ao seu lado. Desde que o ídolo em questão não seja um general nazista ou algo do tipo, o que é um problema a parte, a relação costuma ser proveitosa para ambas as partes: o artista se sente honrado por ser admirado e tocar as pessoas com seu trabalho, e o fã tem uma influência positiva que o estimula a buscar seus sonhos. O fã de Ana Hickmann não entendia nada disso, passou dos limites, e se deu mal. Pior ainda, colocou em perigo a apresentadora e as pessoas que a acompanhavam –que, graças a Deus, agora estão todas bem.

Da mesma forma, a obsessão num namoro pode ser fatal. Muitos devem se recordar da jovem Eloá, que, há alguns anos, foi feita refém num apartamento pelo próprio namorado, e terminou morta com um tiro na cabeça. O rapaz era, como o fã, obsessivo. E a garota, infelizmente, vítima da obsessão alheia. O ciúme doentio, mais comum do que se imagina, mesmo que não atinja as proporções drásticas dos relatos acima, é danoso, desequilibra a relação e a vida dos envolvidos.

Pais excessivamente protetores, da mesma forma, adoecem os filhos. Proteção e cuidados paternos são, além de muito bem vindos, necessários. Novamente, o problema vem com o excesso, com o desequilíbrio, com a compulsão. A síndrome que ocorre nos filhos superprotegidos tem até nome: Transtorno da Personalidade Dependente (TPDP), e, segundo a Organização Mundial da Saúde, os afetados apresentam dificuldade incomum em iniciar projetos ou fazer coisas por conta própria, chegam a extremos para receberem cuidados e atenção, e procuram urgentemente uma fonte de apoio quando um relacionamento importante termina. Este último sintoma, uma janela aberta para o uso e abuso de substâncias de todas ad formas.

É preciso buscar o equilíbrio em todas as relações. Quando a linha da normalidade é cruzada, surge um território perigoso para todas as partes envolvidas e ainda para quem está no entorno dessa relação doentia. A linha que divide os relacionamentos saudáveis dos obsessivos é tênue, e é ainda mais difícil perceber a diferença para quem está olhando de dentro. Ana Hickmann, seu cunhado, e sua assessora baleada estão bem, ainda que, tenho certeza, psicologicamente abalados. Por muito pouco, o desfecho da história não foi diferente. Olhos abertos: a obsessão é mais perigosa do que pode parecer.

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EDITORIAS

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Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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