O Instituto Movimento e Vida se mantém apenas com as doações recebidas de forma direta e do que arrecada em eventos beneficentes organizados ao longo do ano. Devido à pandemia de Covid-19, a realização dessas atividades não foi possível, o que fez com que a verba do projeto chegasse ao fim. Os atendimentos no instituto retornaram no último dia 27 de julho, com todos os cuidados e obedecendo a todos os protocolos de segurança dos órgãos de saúde. Essa volta gera custos altos. Para cada atendimento, cada toque, é necessário uma nova luva, nova assepsia. Por isso, os gastos com materiais estão ainda maiores. Em razão de toda essa situação e para ajudar o projeto nesse momento, o instituto lançou uma vakinha on-line.
O trabalho desenvolvido no Instituto Movimento e Vida, que fica no Complexo do Alemão, zona norte do Rio, existe há 14 anos. A idealizadora do projeto, a fisioterapeuta e psicóloga Monica Cirne Albuquerque, conta como foi o início de tudo. “Por 11 anos eu fiquei em um espaço cedido, na Rua Paranapanema. Esse lugar tinha menos de 6 metros quadrados. Durante todos esses anos, eu atendi sozinha. Eu e Deus. Também tinha a secretária, que era voluntária e amiga. Não imaginava que o trabalho fosse tomar a proporção que tomou. Porque no primeiro momento, quando eu quis fazer isso, foi na intenção de ajudar mesmo. Eu morava na travessa Laurinda, morei lá por 27 anos, e percebi a dificuldade da comunidade com relação à situação da reabilitação”.
Fisioterapia na favela
De acordo com Monica, o Instituto Movimento e Vida é o primeiro e único projeto do país de fisioterapia e reabilitação gratuita criado em uma favela e feito para atendê-la. “Eu não via esse trabalho acontecer para as pessoas da favela e eu via muita gente com deficiência, abandonado. Porque a ausência do poder poder público é clara. O atendimento público também é falho e isso me incomodou, eu quis fazer alguma coisa para ajudar as pessoas. Não tenho prazo para terminar. Vou fazer até o dia que eu conseguir. No começo, não pensei que fosse ter essa procura toda. Só que o trabalho cresceu a ponto dos passos precisarem ser mais largos do que eu conseguia dá-los. Depois disso, começou também uma preocupação em desocupar o espaço que me havia sido emprestado. Mas eu não tinha renda para isso porque não cobro atendimento”.
Espaço próprio
Com a pressão de ter de sair do local em que fazia seus atendimentos gratuitos ajudando a comunidade, Mônica começou a buscar alternativas. “Meu marido, Antônio José, tinha um imóvel aqui na Rua Andorinhas que estava alugado. Ele vinha acompanhando todo meu trabalho e disse que não ia renovar o contrato para pedir o imóvel e a gente poder trabalhar para deixar o local de acordo com as minhas necessidades. Depois da desocupação do espaço, começou todo trabalho”.
“Meu marido e o Renato, amigo da família, trabalhavam dia e noite. Também vieram pedreiros para ajudar. Fazíamos eventos para arrecadarmos fundos para as obras. Parte dos gastos com a reforma veio de doação mas a maior parcela de gastos foi do meu esposo, ele tirava do bolso dele. Esse processo levou quatro anos, entre a desocupação e o fim das obras. Mas não parei de atender os doentes em nenhum momento. Eu gostaria de ter tido o abraço da comunidade, porque foi um período difícil”.
O trabalho desenvolvido pela fisioterapeuta tem reconhecimento internacional. “Veículos de comunicação da França, Alemanha, Espanha e de outros países do mundo vieram aqui conhecer o instituto. Apenas fico triste de não ter esse mesmo retorno da mídia nacional”. Mônica relembra os momentos antes de inaugurar seu novo espaço.
Dificuldades e renovação
“Quando a obra acabou, em 2016, estava tudo pronto em dezembro e nosso plano era inaugurar em janeiro de 2017, próximo ao meu aniversário. Mas meu marido veio a falecer nesse período, e a inauguração foi adiada. Foi um momento muito complicado e marcante para mim, precisei me afastar por um tempo. Mas votei porque acredito no que faço e sei que se eu não fizesse ninguém faria. Eu, que cuido das vítimas da violência, perdi meu esposo para a violência. Foi muito triste e precisei me reinventar para voltar”.
Depois desse período de tristeza, luto e reclusão, Mônica resolveu voltar para o Instituto Movimento e Vida, afinal, o projeto da sede foi desenvolvido pelo casal, e a fisioterapeuta é comprometida com a causa. “Eu necessitava continuar, trabalhamos para isso. Inauguramos no dia 13 de maio de 2017 e de lá para cá, não parei mais. Trabalho muito no atendimento mas também na captação de recursos. Não tenho ajuda nenhuma do poder público, seja ele municipal, estadual ou federal, nem de nenhum político, graças a Deus. Não tenho ajuda de ninguém, apenas de doações e parcerias. É preciso ter um equilíbrio muito grande”.
Sequelas da covid-19
Mônica relata que, atualmente, tem recebido muitas demanda de pessoas que estão em casa com sequelas da covid-19. “Ninguém fala sobre esses problemas que ficam, muitas pessoas que tiveram infartos ou derrames voltaram a ter esses problemas e são casos graves. Quando eu reabri o instituto, precisei reavaliar todo mundo. Os doentes da favela não são instruídos, não são orientados e, acima de tudo, não são ouvidos. Isso é recorrente mas durante a pandemia está sendo pior ainda”.
Moradora conhecida por todos no Complexo do Alemão, a psicóloga fala das dificuldades de atender em meio a pandemia causada pelo novo coronavírus. “Precisei parar e estudar. Abdiquei de momentos de lazer para poder entender melhor e saber com que iria lidar. Até porque eu não saberia com certeza se meus pacientes teriam ou não sido infectados pelo vírus e ainda sabemos pouco sobre a doença, é muito complexo. Então o caminho é parar e estudar, entender tudo da melhor forma possível para me proteger e aos doentes também”.
Além dos moradores do Alemão, Mônica também atende pacientes da Vila Cruzeiro. Ela conta que decidiu voltar ao atendimento – depois da autorização de órgãos de saúde, muito estudo e de adquirir todos os principais Equipamento de Proteção Individual (EPIs) – pelo compromisso com os pacientes. “Tratar de pacientes de graça na favela é só no amor. É, de fato uma missão: resgatar a dignidade e a qualidade de vida das pessoas. É por isso que o instituto existe”.
Pedido de ajuda
O Instituto Movimento e Vida conta com 10 voluntários no total e atende a mais de 100 famílias. Lá, a doutora Mônica realiza sessões de fisioterapia com especializações neurológicas. Além do espaço em que atende pacientes gratuitamente, ela tem uma clínica particular na frente, onde trabalha e obtém sua renda pessoal. “O que eu preciso de verdade é, claro além de ajuda financeira e voluntários, que a comunidade entenda a importância deste trabalho. Eu faço tudo por amor e estou sempre disposta a abraçar a comunidade, por essa razão, quero mesmo que as mídias locais e quem mora aqui conheçam o instituto. Precisamos da ajuda de todos”.
Para ajudar a manter o instituto aberto, uma vakinha on-line foi lançada no último dia 25 de agosto. “Esse pedido de ajuda é emergencial mesmo. É para os materiais que usamos nos atendimentos como de higienização do Instituto, além de água, luz e o IPTU que vem com taxa de incêndio e vigilância sanitária. A coisa está séria. Estamos preocupados com o futuro e com receio de fechar e o reflexo já dá sinal. Isso é muito grave. Significa mais vidas sem tratamento”.
Além do financiamento coletivo, também é possível doar diretamente para o Instituto Movimento e Vida por meio de depósito bancário – Banco Bradesco agência: 2043-5, Conta corrente: 41939-7, CNPJ: 19012519/0001-18 – ou no próprio espaço físico. A campanha de doação on-line vai até o próximo dia 13 de setembro. Uma live será realizada no último dia da campanha, das 13 às 14hs na página no Facebook do instituto, para falar sobre o trabalho desenvolvido nos últimos meses pela ONG. Participe!