Diretor de ‘É o Complexo’, gravado no Alemão, explica como colocou 100 moradores para participar do filme; veja cena exclusiva

Com atores de favelas e cenas improvisadas, filme mostra realidade da favela sob a lente de moradores
Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades

Luz, câmera e favela! Onde os sonhos de cinema parecem distante, o diretor Gabriel Machado fez se tornar possível. E não foi sozinho. Gravado no Complexo do Alemão, o filme ‘É O Complexo’ contou com a participação de 100 moradores e cenas improvisadas por atores de favelas. Em entrevista para o Voz das Comunidades, o diretor e elenco do filme explicam o processo de filmagem e mostram uma cena exclusiva da produção; veja mais abaixo!

O filme nasceu a partir de uma web série criada em 2021, fruto da parceria entre Gabriel e os amigos Wellington, Leonardo e Carlos 7. As primeiras cenas foram gravadas com duas câmeras Canon SL3 e muita garra. A ideia aconteceu quando o roteirista Gedai apresentou o material ao diretor da TV Globo, Vinícius Coimbra, também co-diretor do filme que decidiu investir na ideia.

Eu já estava cansado, pensei em desistir. Mas quando vi que o cara era da Globo e queria mesmo apostar na gente, aí eu falei: vamos até o fim. E nasceu o nosso filho, ‘É o Complexo”, relembra Gabriel.

Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades

O filme acompanha dois estudantes de cinema, Gabriel (interpretado por ele mesmo) e Mel, que decidem documentar o cotidiano de uma favela carioca. A trama transita entre bailes, ações policiais, conflitos e afetos, sempre com o olhar de quem vive aquilo de verdade.

É drama puro. É tensão o tempo todo. Mas também tem muito amor. É o nosso cotidiano, retratado com verdade”, resume Gabriel, um dos diretores do filme.

Todos os personagens são interpretados por moradores reais de comunidades do Rio. A escolha, segundo Gabriel, é estética, política e emocional. “A gente não queria nomes famosos. A gente quer criar os nossos atores. Quando você vê alguém da sua quebrada na tela, você acredita. Isso muda tudo.”

Entre esses novos rostos do cinema está Giovanne Cesar Santos, que vive um “puxador de guerra” no longa. “O personagem é linha de frente, é pesado. Mas é o que muita gente vive aí fora. Sem filtro. Sem dublê. Se for pra dar porrada, a gente dá. Se for pra tomar, a gente toma também”, conta. E completa: “Quero que esse filme exploda. Que mostre que a gente tem talento de sobra. Da favela pro mundo, pai.”

Giovanne começou no humor e passou pela web série antes de chegar ao filme. “O Biel me puxou pro corre. No começo eu nem sabia o que tava fazendo, mas gostei logo. Me amarrei. Hoje em dia eu vivo da arte, comprei meu bagulho certo, tô focado em crescer.”

Giovanne Cesar, ator de ‘É O Complexo’ (Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades)

No elenco do filme, o ator e humorista Augusto Nasser, ou Guto Nasser, vive um dos momentos mais intensos de sua carreira. Longe do riso fácil dos esquetes que produz na internet, ele mergulhou no universo tenso de uma operação policial em uma favela do Rio de Janeiro.

No longa, Guto interpreta um policial envolvido em ações de confronto, num enredo que espelha o cotidiano duro e sangrento das periferias cariocas. “Meu personagem foi um policial, né? Aquelas cenas que a gente já conhece: polícia subindo o morro, troca de tiro, prisão. Coisa que a gente vê no dia a dia aqui no Rio. Foi pesado, mas muito bacana de fazer”, relembra.

Guto Nasser, ator de ‘É O Complexo’. (Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades)

O que mais o impressionou, no entanto, foi o nível de realismo do projeto. “As cenas foram muito reais. O Gabriel e o pessoal conseguiram transmitir a verdade da favela de um jeito que eu nunca tinha visto. Foi impressionante”, afirma.

A participação da comunidade foi essencial para o projeto. Gabriel conta que mais de 100 moradores participaram das filmagens. “Bati de porta em porta pedindo autorização. Era tipo: ‘a senhora pode ficar ali na janela?’, ‘o menor solta a pipa ali?’. Todo mundo se envolveu. O filme é nosso.”

Hugo Oliveira, conhecido como Índio, é símbolo de superação. Com uma trajetória no crime organizado, ele viu na arte uma forma de recomeçar. “Eu tinha saído da vida errada fazia cinco dias. Fui convidado pra gravar e fui com vergonha. No primeiro dia eu me apaixonei. Nunca mais parei”, conta. “Já sonhei com o filme passando no cinema e minha família ali comigo. Isso é pra sempre.”

Hoje ele sonha alto. “Quero viver disso. Ser exemplo pro meu filho. Mostrar que é possível sair do crime e virar artista. Se eu consegui, outros também conseguem.”

Foto: Hugo Oliveira, ator de ‘É O Complexo’. (Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades).

Sobre o lançamento do filme, a previsão é que seja lançado no streaming ainda no próximo mês. “Estamos em contato com distribuidoras e plataformas. Já tivemos algumas conversas, mas ainda estamos buscando quem abrace o projeto com o respeito que ele merece. Esse filme não é só ação, é denúncia, é arte, é favela se contando”, explica o diretor Gabriel Machado.

Veja um trecho exclusivo do filme:

Vídeo: Divulgação/Cortesia para o Voz das Comunidades

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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