O MANIFESTO ARTÍSTICO: SEVEN LIFES! A estilista cearense Maria Mesquita, conhecida como Ravena, tem 28 anos e chegou ao Rio de Janeiro aos 17. Atualmente, ela vive no Morro da Baiana, na Zona Norte (CPX). Através de suas criações e arte, Ravena busca fortalecer a cultura de rua e tornar a moda mais acessível, promovendo alternativas sustentáveis e coletivas. Sua marca nasceu junto ao seu ateliê de costura e, em apenas dois anos, conquistou marcos significativos, como o Ensaio Drop do Coletivo HK que ela faz parte e a criação de uma blusa para a cantora Ludmilla no Lud Sessions com Iza.
Sua infância foi fortemente influenciada pela presença da mãe, costureira, que a iniciou no universo da confecção de roupas. A curiosidade e a criatividade de Ravena já se faziam presentes nas roupas que ela customizava, rasgava e transformava de forma única desde muito pequena. Enfrentando o luto pelo falecimento de sua mãe, Ravena sentiu que era o momento de dar continuidade ao legado dela, encontrando incentivo para seguir seu próprio sonho na área de styling. Há um ano e quatro meses recebeu de seu pai sua primeira máquina de costura.
Assim, ela desenvolveu seu acervo e identidade visual para integrar esses elementos à moda, refletindo sua trajetória pessoal. A estrela representa sua mãe, o número 7, e é uma homenagem ao seu pai. Os grafites fazem referência ao período em que foi parte da Família 17, um grupo de pichadores de Manguinhos. Sua base é o jeans com o conceito de Upcycling, que, em tradução livre, significa reciclagem. Esse movimento dá valor às peças que seriam descartadas, sem comprometer sua essência, numa criação autêntica e nova.
“Eu sabia que podia fazer a diferença. Foi aí que comecei a garimpar peças de brechó, cortar e transformar em algo novo. Por exemplo, pegar uma calça e criar um conjunto, ou transformar em uma nova calça, colocando toda a minha criatividade em ação”, afirma Ravena sobre o início da sua marca.
Há uma troca genuína com os artistas que ela veste, levando em conta suas medidas, gostos e preferências. Ravena compreende a importância de todo o processo criativo, desde a costura até a entrega final. Cada peça é cuidadosamente feita à mão, o que a torna única. Ela dá vida a cada criação, como se tecesse uma história, desde o desenho inicial à produção, passando pelos cortes, pelas linhas e pelo contato direto com a styling.
A moda favelada
O envolvimento com a Roda Cultural da ZN, realizada no Complexo do Alemão, proporcionou a Ravena uma vivência com MC’s e artistas, abrindo novos caminhos para refletir. “Como os artistas gostam de se vestir? Como preferem se expressar?”, questiona-se. A partir dessa experiência, ela iniciou o Upcycling para a favela, criando peças com influências do picho de grafite, saias curtas e mostrando para as pessoas ao seu redor como sua arte pode se conectar com elas. “As pessoas buscam minha arte e se identificam, pois ela está bem consolidada dentro do Hip Hop.” Ravena percebeu que o CPX cria suas próprias tendências, como camisas de time, roupas curtas e biquínis, que ela mistura com suas produções alternativas.
A favela, por si só, é uma grande referência. Estilistas renomados frequentemente pegam elementos dessa cultura e os reproduzem em produções em larga escala, que acabam sendo caras e inacessíveis. “Por exemplo, uma saia minha custa R$ 150,00, enquanto em grandes varejistas de roupas você encontra algo similar por R$ 200,00 ou até mais”, comenta a estilista sobre a apropriação que o mercado explora das periferias.
“Ainda tô furando essa bolha no Complexo do Alemão, a saber o que eu faço. Quero que os moradores daqui [CPX] entendam que eu tô aqui para deixar todo mundo lindão e trajadão”, fala da estilista empolgada sobre os planos futuros e o alcance de sua arte.

Seven Lifes e futuro
“Estou cansada de viver apenas para os outros, de deixar minha arte de lado e guardá-la para mim”, é o que Ravena diz em um momento de revolta, quando decidiu tomar uma atitude por conta própria. Foi então que nasceu sua afirmação pessoal. “Parece até que eu tenho 7 vidas”. Um marco que lhe permitiu estabelecer sua originalidade e construir sua carreira.
Assim como as roupas prestes a ser descartadas, ela as transforma, renovando-as com uma nova vida. Com o tempo, se aperfeiçoou por meio de cursos de modelagem e costura, adquirindo as habilidades para criar peças sob medida e produzir roupas para si mesma, o que lhe proporcionou mais credibilidade e confiança. As suas inspirações na moda vem Rita Lazarrotti, stylling de Bruna Marquezine e também, da Milena da Mata e do Abacaxi, estilista da Vila Kennedy e com a marca Pinã que constrói uma estética di cria.
Seus planos para o futuro incluem organizar um desfile no Complexo do Alemão e viver plenamente de sua arte. Ravena também pretende se especializar com a graduação em Design e Moda, expandir seu ateliê e criar uma casa de cultura onde todas as formas de arte possam se encontrar, se fortalecer e crescer juntas.
“A roupa é a primeira coisa que vemos. Nossa primeira forma de expressão, antes mesmo de abrirmos a boca ou fazermos gestos”, afirma Ravena sobre a importância de seu trabalho. Ela também busca sempre refletir a pluralidade de corpos favelados, vestindo amigos e artistas, e trabalhando com o Upcycling em corpos plus size, mostrando que a moda é nós que cria.
