Voz das Comunidades em uma jornada de imersão revela conexões culturais e sociais entre as periferias das duas cidades 

Tanto no Brasil quanto na Colômbia, as comunidades negras enfrentam desafios históricos de exclusão e invisibilidade, mas também protagonizam iniciativas transformadoras
Equipe do Voz no intercâmbio cultural em Medellín. Foto: Sandra Barrientos/Universo Centro

Chegamos à Colômbia! E tudo começa, e recomeça nas ruas de Medellín que são muito parecidas com as favelas cariocas. É ali que pulsa o ritmo da cidade: no sabor da gastronomia, no vai e vem do comércio, nas desigualdades socioeconômicas. Espaços que também são fronteiras invisíveis, mas reais. Dividem territórios, vidas e denunciam a ausência do Estado. Ao mesmo tempo, mostram em detalhes a resistência, a criatividade e a força das comunidades são elementos que ultrapassam fronteiras. 

O Universos das Vozes, uma colaboração entre Voz das Comunidades e Universo Centro, convida você a mergulhar de corpo e alma nesta experiência. Um intercâmbio binacional que construiu pontes para revelar semelhanças e choques culturais entre Rio de Janeiro e Medellín, explorando as conexões profundas que unem essas duas cidades. 

Medellín ressignificou sua realidade urbana com soluções criativas nas áreas urbanística, artística e literária. Mais que políticas públicas, destaca-se uma luta social coletiva que resiste. Algumas dessas iniciativas ecoam em projetos como base de estudo no Rio de Janeiro, voltados à ocupação dos espaços urbanos. A experiência reforçou o papel da cultura na construção de identidades e na valorização da diversidade. 

Durante a imersão, compartilhamos vivências, histórias e perspectivas. Um dado importante em uma perspectiva racial de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, é que no Rio de Janeiro, a população negra (pretos e pardos) representa 54,3% do total de habitantes. Esse número reflete uma mudança significativa em relação ao Censo de 2010, quando a população branca era majoritária na cidade. Hoje, há cerca de 3,4 milhões de pessoas negras no Rio, sendo 71,3% pardos e 28,7% pretos. Essa população tem uma presença marcante nas periferias e favelas cariocas, onde a cultura e a resistência se manifestam de diversas formas através do cotidiano. 

Já em Medellín, a população afrodescendente representa cerca de 10% dos habitantes, o que equivale a aproximadamente 260 mil pessoas, segundo o Censo Nacional de População e Habitação (CPV2, 2018). Essa população está concentrada principalmente em bairros periféricos e nas populares comunas, um espaço historicamente marcado por conflitos, mas que hoje se destaca pela arte urbana e iniciativas comunitárias que ressignificam as regiões. Muitos afrocolombianos em Medellín têm raízes nas regiões do Chocó e do Valle del Cauca, áreas de forte presença negra na Colômbia. 

Comuna 13, importante ponto turístico da Cidade de Medellín. Foto: Leticia Gonçalves/Voz das Comunidades

Essa conexão entre as cidades reforça um ponto essencial: a cultura não é só expressão, é sobrevivência. Tanto no Brasil quanto na Colômbia, as comunidades negras enfrentam desafios históricos de exclusão e invisibilidade, mas também protagonizam iniciativas transformadoras. A troca de experiências entre Rio e Medellín revela um caminho possível, no qual memória e pertencimento constroem futuros mais justos e inclusivos. Essa troca evidencia como a cultura e a resistência são forças que transcendem fronteiras e fortalecem comunidades. 

Nos próximos meses convidaremos leitores do Voz das Comunidades a apertarem os cintos, e sentirem a experiência deste intercâmbio para explorar vivências, culturas e similaridades com nossos irmãos. A proposta é aprofundar os diálogos sobre resistência, pertencimento e identidade, ampliando o impacto do projeto na construção de futuros possíveis. Temos muito a compartilhar sobre a relação entre Medellín e as favelas do Rio. ¡Hasta luego! Até a próxima edição. 
 
Mural: nosso passaporte carimbado 

Na Comuna Uno, na localidade Santo Domingo, em Medellín, realizamos um mural de 2×2 com referências cariocas, com plantas espada de São Jorge, mesa vermelha com um copo americano com cerveja, nosso carro-chefe, o jornal Voz das Comunidades sobre a mesa inscrito “Universo Centro”, com as cores do projeto, e abaixo da mesa, o símbolo do imaginário cultural, o cachorro vira-lata caramelo.  

As imagens trazidas brincam com a relação íntima de coincidências e encontros entre Medellín e Rio de Janeiro, em uma mistura de sentidos e afetos, onde o cachorro caramelo é considerado patrimônio cultural brasileiro. E para eles, “perro callejero caramelo”, também aparecem nas ruas e comunas. Outro ponto são as folhas da Espada de Santa Bárbara comuns nos jardins e casas em Medellín, e aparecem no Rio, com significados de proteção e cuidado, relacionados às religiões de matriz africana. 

Mural realizado na Comuna Uno, em Santo Domingo, Medellín. Foto: Leticia Gonçalves/Voz das Comunidades 
 

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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