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Como os jovens das favelas estão se preparando para o Enem?

Mesmo em meio à pandemia, o Enem 2020 será realizado neste domingo (17). Pré-vestibular Estudando para Vencer defende o adiamento
Foto: Vilma Ribeiro/ Voz das Comunidades

Faltando 3 dias para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). O que se observa entre alunos e professores é um sentimento de total descaso por parte do Ministério da Educação, que insiste em manter as provas durante a pandemia do coronavírus. Vale lembrar que só no Brasil, na data de ontem (13/01), o número de mortes por covid-19 é de 204.690 mil e 8.195.637 casos confirmados.

Será que todos os jovens estão preparados para fazer as provas? Todos conseguiram estudar e se preparar, no ano de 2020, com as aulas que foram virtuais? O Voz das Comunidades foi na favela da Vila Cruzeiro, Zona Norte do Rio, para conhecer o curso preparatório “Estudando para Vencer”, conversar com alunos e professores, afim de saber como eles estão se preparando para o exame.

Marcelo Martins, coordenador e professor do projeto
Foto: Vilma Ribeiro/ Voz das Comunidades

Para o coordenador e professor do projeto Estudando para Vencer, Marcelo Martins, o ano de 2021 não tinha que ter ENEM. De acordo com ele, 2020 foi um ano muito difícil para a educação e a maior preocupação não foi só em preparar os alunos para os exames, mas sim ajudá-los a se alimentar.

“Estamos vivendo um momento difícil. Nossa preocupação aqui no curso preparatório deixou de ser aplicação de conteúdo para ser segurança alimentar. Além de focar nos estudos, temos que ter a garantia que nossos alunos terão alguma coisa para comer dentro de casa”, comentou.

Sala de aula do Estudante para Vencer.
Foto: Vilma Ribeiro / Voz das Comunidades

Marcelo esclarece que os alunos da favela tem um perfil e rotina de estudo muito diferente do habitual. “Nem todos os meus alunos tem acesso à internet. A maioria são pais e mães de família. Tem que trabalhar. Na grande maioria são os únicos provedores de dentro de casa.”

O professor afirma que o curso costuma ter presencialmente de 30 a 55 alunos. Mas, por conta da pandemia e a falta de acesso dos alunos, apenas 6 conseguiram se inscrever no ENEM. Dos 6, menos desse número conseguem assistir às aulas via on-line frequentemente. Para ele, o MEC não deu para os alunos uma opção de escolha. Além de ter escancarado um abismo enorme da desigualdade social, afirmou também que a instituição não quer ver os pobres entrando no ensino superior, ocupando seus lugares nas universidades públicas. “A educação no Brasil não foi feita para os pobres, e sim para quem paga mais”, diz.

“Sou totalmente contra a realização do ENEM 2020. Para mim, esse é o ENEM mais desigual de todos os tempos. O aluno pobre não está tendo acesso ao conteúdo competitivo, ele está sendo excluso dessa participação e dificilmente terá chances de conseguir uma boa qualificação”, defende Marcelo.

Ana Beatriz de 20 anos, moradora da Vila Cruzeiro.
Foto: Vilma Ribeiro / Voz das Comunidades

Para a jovem Ana Beatriz de 20 anos, moradora da Vila Cruzeiro, esta é a sua primeira oportunidade de prestar o exame. A jovem sonha em fazer medicina e fala sobre ser a primeira em sua família a tentar entrar para a universidade.

“Sou a primeira da minha família a fazer o ENEM. Quero prestar o concurso para Medicina. Eu vou no hospital e vejo tanto descaso. Quero mudar essa história, quero contribuir para a saúde das pessoas”. Mas, a jovem deixa claro seus anseios perante ao ENEM. “Primeiro foi a pandemia, depois a falta de internet no celular. Estudar sozinha seria muito diferente se eu estivesse na sala de aula com o professor presencialmente. Não há condições de estudar dentro de casa, nas condições de favelada, com tiroteios, tendo que trabalhar, sem um ambiente para estudar”, relata a aluna.

Para o professor Bruno de química a prioridade no período de pandemia foi tratar a saúde mental dos alunos. Foto Vilma Ribeiro / Voz das Comunidades

O professor Bruno, de química, diz que seus alunos não estão preparados para a prova do ENEM e que a prioridade no período de pandemia foi tratar a saúde mental deles. “Não posso exigir do aluno uma concentração vendo ele passando necessidade, fome, tendo que alimentar seus filhos e conseguir um emprego. Como um aluno desse vai disputar de igual para igual com alguém que tem professor particular, que não ficou sem estudar no período de pandemia, que tem acesso a livros, que não enfrente tiroteios, que consegue descansar mentalmente e fisicamente?”.

SOBRE O ADIAMENTO DO ENEM

Na terça (12), A Defensoria Pública da União recorreu da decisão da Justiça Federal em São Paulo, que negou o pedido de adiamento das provas do ENEM 2020. Dessa forma, manteve as datas de realização da prova, marcadas para 17 e 24 de janeiro (versão impressa).

O recurso está no Tribunal Regional Federal da Terceira Região (TRF-3). Por enquanto, prevalece a decisão da Justiça Federal de São Paulo, a qual afirma que, caso uma cidade tenha elevado risco de contágio que justifique medidas severas de restrição de circulação, caberá às autoridades locais impedirem a realização da prova. Se isso acontecer, o Inep, responsável pelo exame, terá que reaplicar o Enem.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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