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Criança em casa, energia acumulada. Segue uma boa dica pra ocupar as crianças nessa quarentena

Texto: Rick Trindade e Mariana Assis

Ilustração de Tay Cabral.
Créditos: Diego Mesquita

Morador, eu sei que não tá fácil. Se o novo coronavírus já nos causava preocupação ainda em janeiro, quando começaram a ser divulgado os primeiros casos, a chegada do Covid19 no Brasil nos alarma e exige cuidado redobrado. Como destacado pelo infectologista Carlos Starling, em entrevista ao Favela em Pauta, a condição de precarização sanitária das favelas é problemática já que favorece à transmissão do vírus. Mas, na medida do possível, estamos nos organizando, naquele jeito que só os crias sabem, para minimizar os danos. O Voz já publicou matérias te dando o papo sobre como se prevenir e o que fazer em caso de contágio. Não dá mole hein. Sua saúde e bem estar precisam estar em primeiro lugar. Valeu?

Uma das recomendações para conter a pandemia, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é o isolamento social. Ou seja, precisamos nos recolher, ficar longe de aglomerações e só sair de casa para tarefas indispensáveis. A prefeitura do Rio antecipou o recesso escolar- tradicionalmente ocorrido em julho. Assim, pais, tias, irmãos são colocados diante de um grande desafio: como entreter as crianças diante da pandemia?  Como acalmar os pequenos se estamos desanimados e temerosos em relação ao futuro?

Que tal ilustrar?

Desenhar pode contribuir para desenvolver a criatividade, ajudar na concentração e na coordenação motora. E o melhor: é uma atividade que pode ser feita em conjunto.

Oficina de pintura com crianças. Foto: Diego Mesquita

 Foi dessa maneira que a publicitária Taynara Cabral, 23, começou a desenhar. Acompanhada de seu pai, a dupla passava horas fazendo arte e se divertindo à vera. Como forma de premiação depois de exercícios pouco simpáticos de matemática, pai e filha desenhavam para relaxar.  A partir dos 13 anos, porém, passou a se dedicar também às ilustrações. 

Tay Cabral. Foto: Arquivo Pessoal

Taynara desenhava e ilustrava pelo computador, mas não compartilhava suas artes. Chegou a criar um perfil no Instagram para publicar seus feitos, mas, em 2018, passou a não só publicar como também adicionou um elemento que guiaria todas às suas produções: a exaltação à negritude. Essa virada de chave aconteceu depois que a ilustradora percebeu que o que pintava não correspondia ao que ela era, uma mulher negra retinta. “Eu reproduzia muito nas minhas criações aquilo que consumia. Eu pintava mas não me via representava”, avalia. 

As ilustrações de Cabral reverenciam mulheres negras que fizeram e fazem história. Marielle Franco (referência na luta dos direitos humanos), Lélia Gonzalez (professora com destaque em estudos de ciência política), Teresa de Benguela (líder quilombola) são algumas das intelectuais negras homenageadas pela ilustradora.  

Ilustrações de Tay Cabral. Foto: Diego Mesquita

No começo de março, Taynara ministrou a oficina Heroínas para crianças. Dividida em super guerreiras, super escritoras, super corajosas e as que possuem o poder da música, os pequenos são estimulados a conhecerem histórias de pessoas que os permitiram existir no mesmo instante em que também se divertem e aprimoram a criatividade. Em razão da quarentena, a ilustradora disponibilizou todo o material das suas oficinas e convoca as “amoras e amores” a pintarem sem limites. 

Já Draco, afirma que nunca trabalhou formalmente como ilustrador. Passou por algumas áreas, até que entre os seus 22/23 anos de idade, começou a trabalhar com designer, e foi aí que a ilustração virou uma companhia, começou a fazer alguns trabalhos como freelancer, mas de alguns anos pra cá, decidiu parar com os freelas, e desenhar pra si mesmo. “Isso me permite desenhar o que eu quero e não preciso passar pelo rolê de aprovações, alterações do cliente e tudo mais”, ressalta Draco. 

Draco. Foto: Arquivo Pessoal

Esse período de quarentena tem sido difícil pra todos nós, algumas profissões permitem que o trabalhador exerça sua função de casa, fazendo o chamado “home office”. Entre os compromissos com o trabalho, a companhia dos pais em sua casa – que a quarentena possibilitou – Draco dedica um tempo aos seus desenhos também, pois ele mesmo afirma que é uma maneira de aliviar a ansiedade. E já que os desenhos fazem tão bem ao criador, o efeito não seria diferente com as crianças. Foi pensando em como sua arte poderia ajudar durante esse período que estamos vivendo, que o designer e ilustrador decidiu compartilhar gratuitamente de sua arte (disponível em: www.dropbox.com/sh/hunwxmlmj5raubf/AACi3pYlvYUJliOljqSjNQ91a?dl=0).“…quando comecei a pensar em como poderia contribuir pro bem estar das pessoas de alguma forma… Então peguei algumas ilustrações que já estavam prontas, retirei as cores e resolvi compartilhar… eu não acredito em arte não acessível, então, compartilhar quase nunca é uma dor.” Diz.

O contato dele com crianças não é algo recente, apesar de nunca ter trabalhado com arte com os pequenos, Draco diz que sua formação no extinto segundo grau foi “formação de professores”, o normalista. E por isso teve contato com crianças e a prática de ensina-lás, além disso, tem muitos sobrinhos e afilhados. O retorno dessa ação tem sido positivo, crianças – e adultos também- estão usando os seus desenhos para colorir: “É  muito gratificante. Eu fico realmente emocionado em ver o pessoal dando vida e novas interpretações ao meu trabalhos… o legal eu que fiz o post direcionado para crianças mas recebi uma série de mensagem com “crianças de até que idade!?” Hehe” 

Temos vividos dias inéditos para muito de nós. Nós brasileiros, de um modo geral, somos bastante festeiros, gostamos de um contato mais próximo com as pessoas, de sair com os amigos nos finais de semana, mas esse momento é de cautela. Então, que atitudes como essa de Draco e Tay, sejam como um abraço nesse momento que estamos vivendo. 

Em tempo, quem tem o prazer de acompanhar Draco nas redes sociais, tem o privilégio de acompanhar o processo de alguns de seus desenhos, e o resultado final de muitos deles. A grande maioria postada nas redes tem um cunho racial, o ilustrador diz que isso acabou acontecendo de forma natural, já que seus desenhos são algo muito confessional. Por outro lado, a ilustração teve um papel fundamental no seu processo de reconhecimento enquanto um homem negro:  “a ilustração esteve diretamente ligada a isso, certa vez eu desenhei uma mulher dentro de um coração cristalizado… quando terminei, percebi que alguma coisa me incomodava nela… e foi aí que me perguntei “porque ela é branca?”… refiz a ilustração e essa pergunta me segue até hoje.” 

Ilustração de Draco. 

Em tempos atuais se fala muito em representatividade, e ela precisa estar presente em todas as áreas da nossa sociedade, Draco afirma que o objetivo do seu trabalho é justamente esse: “é levar representatividade real, consistente e não apenas numéricas para que outras crianças como a que eu fui um dia, possam se ver em personagens fortes, verdadeiros e bonitos, como eu não pude ver em minha época.” 

Então, morador, pega essa dica! Deu pra entender os benefícios da arte de desenhar e pintar. Não perde tempo e coloca a criançada pra fazer arte.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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