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Camelô moradora do Alemão faz sucesso nos sinais de trânsito

Quem precisa pegar a Linha Amarela e passa entorno do Complexo do Alemão, já deve ter visto uma mulher com características indígenas e muito bem produzida andando no meio de um dos acessos à via expressa. Vendendo um produto que é sensação entre crianças e adultos, a bala Halls, a “Índia” como é conhecida, traz consigo uma história de força e superação
Ester Alves vendedora de balas no sinal. Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades
Ester Alves vendedora de balas no sinal. Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades

Ester Alves Texeira de 22 anos, é cria da localidade das Casinhas, no Alemão no passado, devido sua família ser muito pobre e viver numa realidade de péssimas condições, quando criança, com apenas 7 anos de idade ela sentiu a necessidade de ajudar seu pai a mudar a situação em que vivia. Juntos, os dois seguiam todos os dias para o sinal da Mangueira, o ponto onde vendiam bala no trânsito. Sempre praticando os ensinamentos de seu pai, Ester cresceu aprendendo as vivências do trabalho informal na rua mas sempre conciliando com os estudos.

A jovem, conhecida como Índia, já tem seu próprio ponto de venda. Trabalhou de carteira assinada, mas não deixou de ser camelô no trânsito. Ester administrava seu tempo para cumprir a carga horária no trabalho e conseguir a renda extra que vêm dos sinais. Nesses 15 anos vendendo bala nos semáforos, ela desenvolveu diversas competências que são adquiridas no mercado de trabalho. “Aqui na rua você não é simplesmente uma camelô, aqui você desenvolve diversas áreas, você consegue fazer o marketing, como lidar com o público, saber o quanto você tá investindo. Você aprende tudo, o português, a matemática, a física, tudo você aprende! É uma experiência maravilhosa e tá sendo até hoje, porque tem cliente que me viu com 7 anos e ainda compra doce comigo no sinal, tem clientes que passam por mim já que me pegaram no colo.” – Disse a camelô.

A jovem já tem seu próprio ponto de venda. Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades

Ester aperfeiçoou tudo o que aprendeu com o pai, com toda a experiência adquirida, ela foi capaz de aplicar suas competências na venda das balas. Seu diferencial não é só conseguir com que o cliente compre o produto, mas proporcionar uma experiência. “Um dos maiores desafios foi enfrentar o meu próprio eu, porque muita das vezes eu não estava bem e sabia que tinha que trabalhar e tirar um sorriso da pessoa. A intenção não é só vender o produto, é fazer a pessoa ter um dia diferente, um sorriso muda tudo, você fica marcado. Se alguém passar aqui e te ver sorrindo, ela não vai esquecer, se não comprar hoje, você já garante a venda de amanhã”.

A vendedora é vaidosa e boa parte do seu dia está exposta a diversos fatores que podem afetar seu desempenho na venda dos produtos, porém, Ester sabe lidar com as adversidades que o seu ambiente de trabalho proporciona, até mesmo na chuva. 

“Eu amo trabalhar na chuva, é o que eu mais gosto! Engarrafa tudo e aí eu posso vender tranquilamente, isso me favorece muito. Fico descalça pra não correr risco de escorregar, mas sempre no brilho, maquiada, bem vestida, sempre bem apresentável. A primeira impressão é que fica, não precisa ser com apelo a sensualidade, a vulgaridade, e sim algo discreto, mas que chame atenção do cliente”.

Ester aperfeiçoou tudo o que aprendeu com o pai. Foto: Vilma Ribeiro/Voz das Comunidades

Por ser mulher e camelô, a jovem ressalta não só o preconceito que está presente no cotidiano, mas a realidade que ela enfrenta em relação ao assédio. “Se cada um que olhasse com maldade me desse 1 real eu estava rica! Por mais que eu trate meu público bem, como sempre faço, sempre tem um que vai olhar de cara feia, desprezar por ser camelô. Vai olhar pra você e falar que tá trabalhando ali porque está passando fome. Não! Ás vezes não é só por necessidade, é por amor, porque eu tenho amor ao que eu faço. Se eu não tiver amor, eu não consigo produzir”.

Ester conta que já houve situações em que terminou relacionamentos por conta do parceiro não concordar em ela trabalhar nas ruas, mas a jovem afirma que não aceita depender de ninguém e mostra isso com seu esforço. Seu trabalho já é reconhecido no meio dos próprios camelôs. “Eu rodo tudo, aonde eu entro eu sei chegar e sei sair, é muito gratificante ver que os próprios camelôs, seus companheiros de trabalho, te recebem bem, gostam de você, mesmo sendo uma concorrente. Te olhar não só como uma camelô, mas como mulher e ver respeito, conduta, aprendizado, porque a gente aprende um com o outro”. – Disse a vendedora. 

Ester tem um sonho de ingressar no Ensino Superior e quer a oportunidade de conseguir uma bolsa de estudos para cursar a faculdade de Direito. “Eu tenho um sonho e vou correr atrás. O que me falta é oportunidade. Se eu tiver uma, o resto eu faço acontecer. Espero que através disso, alguma oportunidade apareça. Um dia falaram pra mim que me procurariam pra contar a minha história, claro que tem pessoas que vivem coisas piores, mas eu entrego nas mão de Deus, porque hoje eu não passo mais fome, mas tem pessoas que passam. Tô com a mente muito focada no meu objetivo e não vou sossegar enquanto não chegar lá. Não tive boneca da Barbie original, não tive minha festa de 15 anos,nem a penteadeira que era meu sonho. Meu chinelo vivia com prego em baixo. Hoje eu penso no meu amanhã e vou conseguir.”

Ester tem um sonho de ingressar no ensino superior, ter a oportunidade de conseguir uma bolsa de estudos para cursar a faculdade de Direito. Foto: Vilma Ribeiro/ Voz das Comunidades


A luta pelo sonho continua, seja no sol ou na chuva, Ester segue em busca de proporcionar uma vida melhor para sua família e realizar o seu objetivo de se tornar uma advogada. Tudo isso reconhecendo a sua trajetória e o lugar de onde ela veio. A rua não é só um ambiente de trabalho mas também um lugar onde a jovem formou laços fortes que a encorajam na caminhada. “O sinal não me trouxe apenas experiências, mas também trouxe amigos. Através de um cliente eu consegui resolver um problema de saúde que me acometeu, ele me ajudou simplesmente pelo carinho, por passar todo dia e me ver trabalhar no sol e na chuva. Pessoas que não são de sangue, mas família, pessoas que eu vou levar por toda a minha vida e quando eu chegar lá, realizar o meu sonho de terminar a minha faculdade, eu jamais vou esquecer da onde eu saí, nunca vou esquecer de tudo o que eu passei.”

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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