Sempre me intrigou pagar por um serviço que não é eficaz. O valor aumenta a cada ano, às vezes mais de uma vez no mesmo ano. Os usuários, mesmo que esgotados com a situação, têm que se adaptar, “aceitar”, pois a locomoção está no nosso dia a dia, para trabalhar, estudar ou qualquer ir e vir em uma distância considerável. Gosto de expor as situações diárias no transporte público para tentar comparar as minhas reflexões com as de outras pessoas, usuárias ou não, e saber o que elas pensam. Não é diferente a barca do ônibus, o metrô do BRT, o trem do VLT. Transporte público é hilário e triste.
Em qualquer transporte público que utilizemos, é notória a “falta de algo”. Pagou um pouco mais caro no “frescão”, mas o ar não funciona e a janela não se pode abrir, aguente firme. Pagou para andar numa barca velha, lenta e cheia de riscos, pelo trem totalmente desorganizado, sem previsões de par das e chegadas. Pelo metrô lotado, sem ar condicionado, mas que conforta chegar rápido no destino, e por isso aguentar a falta de educação que não é culpa diretamente do indivíduo que habita em mesma sociedade que a minha. Segurança? Sim, vamos sediar as olimpíadas de 2016.
O que vale é a troca de experiência de quem nota e reflete. Observo os usuários e reflito sobre comportamento. Sempre tem um motorista “doido”, o cobrador que deixa passar por trás por um “cafezinho”, geralmente no horário da madrugada. Dizem eles que as empresas não pagam direito, é um extra. Sempre tem alguém que vai trabalhar de manhã e não tomou banho porque acha que o da noite anterior vai durar até o próximo: enganos. Sempre tem a vovó que quer conversar, falar dos netos e fazer comparações entre você e os netos dela. Sempre tem o camelô vendendo alguma coisa pra qualquer fim. Esses dias, a venda era de escova de dente, é maravilhoso, tento ver o lado positivo em tudo. Por falar em camelô, segue um relato que presenciei há alguns dias.
Rio de Janeiro, 15 de Outubro de 2015, 14:30h. Briga de camelô
Uma mulher defende seu filho que brigava pelo ponto de venda de água com outro homem, também camelô. A mulher saca a faca e, para não matá-lo, esfaqueia-o no antebraço.
A ferida é superficial. A discussão continua e surge um lado A e outro lado B. A “puliça” dá sinal de que chegou. Alguns, ao perceberem a presença, dispersam ativando os sensores e abrindo as portas automáticas da plataforma. Eles averiguam rapidamente e um homem manifesta estar a maior baderna: “é que puxaram faca um pro outro aí. Isso tá uma bagunça, todo dia!”
Neste momento já não havia mais faca nem os envolvidos na confusão. Eles se direcionam a outros camelôs, adolescentes, perguntam cadê o dinheiro deles e pedem para segui-los. A mãe do adolescente já barbado foi esconder a faca em frente ao atacadão e retornou para desenrolar com o polícia. Balançando-se como um santo que desce a este plano, ela murmura: “Toda vez que eu estou aqui ele vem querer ficar gritando, ô água! No nosso ponto. Aí não dá, né, seu polícia?!” O comércio segue. Achei eficiente. Rs.
Meu ônibus chegou, o expresso alvorada, mais fedido que o semi-direto, sem ar condicionado, podre. Intrigantemente: vender coisas na plataforma dá tanto dinheiro que dá briga. E depois dessas e de tantas outras, quero que chegue logo 2016. Olimpíadas no Rio. Eeeeeeba! Vai ter segurança eficaz, vai ter BRT, vai ter parque olímpico na Barra, vai ter praia no parque Madureira, vai ter tudo 100% pra geral. Aproveita que a mamadeira tá cheia!