Era para ser mais um dia comum na vida de Natan de Oliveira Silva (23), morador do Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio de Janeiro. Ele estava em uma consulta na clínica Absoluto Odontologia, no bairro de Bonsucesso, quando foi abordado por três policiais militares que afirmavam ter um mandato de prisão, mas em momento nenhum mostraram esse documento.
Os policiais estavam com uma foto de Natan, tirada na estação de trem de Bonsucesso. E através dessa foto, ele foi confundido com outra pessoa pelo sistema de reconhecimento facial da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ).
Natan conta que durante a abordagem, que durou cerca de uma hora, ele foi forçado a dizer que era o criminoso procurado pelos policiais. “Fui impedido de olhar para frente, tive que ficar de cabeça baixa mesmo afirmando ser inocente e dizendo não ter passagem pela polícia”, conta o auxiliar de logística.
O rapaz foi encaminhado para a 21ª Delegacia Policial, localizada no mesmo bairro do ocorrido. Sua advogada, doutora Karla Romão, foi contactada e realizou pesquisas no sistema judiciário e não encontrou mandato e nem irregularidade no CPF de Natan. “Como não existia nenhuma anotação na ficha dele, solicitei a liberação do mesmo e o registro de todo ocorrido”, conta a advogada.
Erros como esse tem sido constantes desde que o sistema de reconhecimento facial foi implantado na Polícia Militar. A advogada Karla Romão conta que o sistema é falho. “Os algoritmos de reconhecimento podem ser tendenciosos ou mal representativos diante da diversidade da população. E por esse motivo pode levar, como o caso do Natan, a erros de identificação. Especialmente em relação a certos grupos étnicos, raciais ou de gêneros”. Ela conta que dada a natureza imperfeita do sistema, é importante que sejam criadas soluções para suavizar esses impactos negativos. “Precisamos lidar com cautela, com cuidado e de forma sensata e multifacetada, considerando os aspectos técnicos”, explica Karla.
Além do erro cometido, o constrangimento não é esquecido. “Me senti coagido e constrangido, pois fui abordado dentro do consultório. Meu supervisor estava lá, todos me olharam de forma assustada e quando estava exposto na rua, vi várias pessoas inclusive conhecidos e amigos”, conta Natan.
O Voz das Comunidades entrou em contato com a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Por nota eles informaram que “a função dos policiais é conduzir o cidadão diante de alguma irregularidade detectada em relação ao banco de dados da Justiça. Conduzido à delegacia, as verificações são realizadas e as demais medidas são ou não tomadas”.