Matéria: Michel Silva*
Na quarta-feira (12), a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou estado de pandemia do novo coronavírus. A proliferação da doença, batizada de Covid-19, tem preocupado as autoridades sanitárias públicas do Rio de Janeiro com as favelas por quatro fatores: a alta densidade populacional, casas muito próximas e limitações estruturais para garantir o isolamento adequado em caso de contaminação pela doença, além do histórico de exclusão social.
O coronavírus é uma doença transmitida pelo contato pessoal próximo com pessoas infectadas ou por meio de tosse ou espirro de pessoas infectadas. Ao tocar objetos ou superfícies contaminadas e em seguida tocar a boca, nariz ou olhos também aumentam os ricos de contrair a doença. O maior estudo científico até o momento sobre covid-19, publicado na revista JAMA, mostra taxa de letalidade de 2,3%, sendo 14,8% pessoas acima de 80 anos, 8% acima de 70 anos e 49% de casos que evoluíram para a forma crítica da doença. Os riscos foram maiores em pessoas com doenças pré-existentes, como hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, doença respiratória crônica e câncer
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De acordo com o infectologista Carlos Starling, diretor da Sociedade Mineira de Infectologia, os moradores de favelas correm sérios riscos por conta de uma condição sanitária desfavorável. “O vírus pode ser isolado na urina e nas fezes, mas ainda não sabemos o papel da presença do vírus nas fezes e na urina no processo de transmissão. Só o fato das pessoas estarem muito próximas e se reunirem em ambientes festivos, depois da segunda cerveja, todos os princípios que estão sendo discutidos de afastamento de pessoas, de cuidar para o contato pessoal não ser tão intenso, eles vão pelo ar e isso facilita o processo de transmissão”, explica usando um evento festivo como exemplo.
Segundo a OMS, as medidas de proteção são as mesmas utilizadas para prevenir doenças respiratórias, como: se uma pessoa tiver febre, tosse e dificuldade de respirar, deve procurar atendimento médico assim que possível e compartilhar o histórico de viagens com o profissional de saúde; lavar as mãos com água e sabão ou com desinfetantes para mãos à base de álcool; ao tossir ou espirrar, cobrir a boca e o nariz com o cotovelo flexionado ou com um lenço – em seguida, jogar fora o lenço e higienizar as mãos.
Até o momento, não há vacina nem tratamento específico, somente tratamento de sintomas. Os casos graves podem precisar de oxigênio suplementar e ventilação mecânica.
No Rio de Janeiro, uma das portas de entradas dessa doença pode ser o turismo. A favela da Rocinha, na zona sul, recebe a maioria das visitas de turistas estrangeiros que colocam a favela no roteiro de visitas. Dados da Pesquisa da Demanda Turística Internacional no Brasil, produzido pelo Ministério do Turismo, mostra que italianos, alemães, franceses, norte-americanos, chilenos e argentinos são os que mais visitaram o Rio de Janeiro entre 2014 e 2018.
Segundo o infectologista Carlos Starling, os moradores da Rocinha correm riscos por receber turistas de diferentes países no momento. “É possível que os turistas estejam portando o vírus. Se estiverem resfriados ou mesmo os indivíduos assintomáticos, nós sabemos que podem transmitir. O que recomendo é que caso os turistas cheguem em determinados locais, não seja feito o cumprimento tradicional de aperto de mão, manter uma certa distância. Isso é importante porque a circulação do vírus no Brasil está vindo de fora para dentro. Então, há sim essa possibilidade”, alerta o especialista que, complementa, “é prudente que os operadores de turismo adotem precauções. Turistas gripados não devem subir nas favelas. Isso tem que ser feito uma triagem com orientação a todos que fazem esse tipo de turismo. Eu entendo que o turismo seja importante na cidade do Rio, para as favelas. Mas nesse momento todos os cuidados devem ser tomados para que a população não seja infectada por pessoas oriundas de regiões onde a circulação viral é muito intensa, principalmente, da Ásia e Europa”.
A Jeep Tour, uma das empresas que realizam passeios guiados na Rocinha e Santa Marta, outra favela na zona sul da cidade, continuam promovendo visitas aos morros, mas adotaram medidas de segurança higiênicas. A empresa está fornecendo álcool em gel para os passageiros e funcionários e higienizaram os veículos. “Estamos em alerta total e havendo um pedido dessas organizações [Ministério da Saúde e Secretarias Municipais e Estaduais] para suspensão dos serviços faremos de imediato, priorizando sempre a integridade da população carioca, da qual fazemos parte e também de nossos visitantes”, informou a Jeep Tour ao Favela em Pauta.
Seis doenças humanas virais no Rio de Janeiro
Os números de casos são referentes aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2020
Embora haja receio por causa da doença, até agora a maioria dos infectados tem uma condição socioeconômica boa porque estavam em viagens no exterior. Mas a tendência é de que a população mais pobre seja mais afetada. Estima-se que o Brasil terá aumento ‘extraordinário’ de casos de coronavírus nas próximas 2 ou 4 semanas, segundo o secretário-executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo dos Reis. “Sabemos que, nos próximo dias, na próximas semanas, que o Brasil tenha um comportamento idêntico a qualquer um desses países. Ou seja, de uma hora para hora, daqui a duas ou quatro semanas, nós vamos passar por um gráfico com esse, com um número extraordinário de pessoas doentes, com sintomas”, disse o secretário, apontando para imagem da apresentação feita na última quarta-feira (11/3) em audiência pública na Comissão de Transparência e Defesa do Consumidor do Senado.
Recentemente, o governo do Rio de Janeiro criou um plano de contingência do novo coronavírus. O documento de 18 páginas vem sendo usado como forma de evitar a disseminação desse novo vírus. “O presente documento tem o objetivo de sistematizar ações e procedimentos de responsabilidade da esfera estadual de governo, de modo a apoiar em caráter complementar os gestores municipais no que diz respeito à resposta ao surto de coronavírus, de maneira antecipada e também na organização de fluxos para o enfrentamento de situações que saírem da normalidade”, explica o governo.
Já a Secretaria Municipal de Saúde diz que os profissionais de saúde das clínicas da família e centros municipais de saúde receberam treinamento e estão preparados para atender casos suspeitos de Covid-19. A rede municipal de saúde ampliou para 150 o número de leitos destinados a casos graves de coronavírus, tornando o Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, em Acari, a unidade de referência para tratamento do Covid-19. A secretária municipal de saúde, Beatriz Busch, tentou tranquilizar a população durante uma coletiva de imprensa. “Não há motivo para pânico. A população deve tratar as gripes como sempre, mas se tiver alguma dúvida, pode procurar nossas clínicas da família e centros municipais de saúde. Se tiver dificuldades respiratórias ou sintomas mais graves, pode procurar as UPAs ou hospitais de urgência”, disse.
*Colaboraram os jornalistas Renato Silva, Gabi Coelho, Daiene Mendes e Michele Silva.