Dia 29 de setembro estreou No Sigilo, um filme que visa trazer a representatividade LGBTQIA+ e negra para o cenário audiovisual independente brasileiro. O filme é o primeiro longa-metragem do canal Deu M, um coletivo que através das suas produções busca dar visibilidade e fortalecer a representatividade das minorias.
O filme conta a história de dois gays moradores de favela que se conhecem desde a infância e foram separados pelo destino. Renatinho (interpretado por Victor Monartz) se envolveu com o crime e Caio (interpretado por Victor Marinho) segue o caminho das artes. Mas, durante o desenrolar da história eles se aproximam, o que se torna uma motivação para Renatinho mudar de vida.
“Quem dera se tivesse um monte de Renatinho que se regenera, acho que de certa forma é até o que a gente queria que acontecesse na vida real. A gente que vive na favela, que tem amigo não só no trafico, mas também que morre por causa de drogas, é baseado um pouco nessa vontade”, comenta Paula Vieira, que interpreta Maria Luiza.
O filme foi gravado durante a pandemia, uma situação na qual todos os planos mudaram. Os membros do Deu M encontraram em “No Sigilo” uma forma de continuar produzindo e levando entretenimento ao público. “De certa forma romantizamos a história do filme, mas é até bom porque estamos acostumado a ver tanta coisa ruim, tanta notícia ruim, então pelo menos estamos entregando alguma coisa boa para fazer as pessoas não pirarem tanto com o que está acontecendo no mundo todo”, diz o roteirista Victor Marinho.
Sobre o roteiro de “No Sigilo”
Victor Marinho e Carol Olimpo são roteiristas do filme, que é dirigido por Jamal D’Izete. Victor tem 24 anos e faz faculdade de Produção Audiovisual, ele conta que o roteiro foi escrito a distância. “Até então eu tinha escrevido 30 cenas, seria um curta. Aí eu mandei para o Jamal e ele falou para eu dar mais atenção a alguns personagens e dar uma reescrevida. Daí eu mandei o texto para a Carol e num final de semana a gente reescreveu o filme todo, começamos do zero. Eu passei toda a ideia para a Carol e ela me mandava as partes do filme. Quando eu fui ver, de 30 cenas tinhas 62. Aí eu falei: meu Deus, é um longa passou de 40 minutos, o primeiro longa do canal”.
Este longa-metragem foge do estereótipo do ator negro na mídia tradicional e traz a representatividade de forma positiva. Victor, como roteirista, se preocupa com a narrativa que coloque os negros em diversos papéis. “A gente veio com essa ideia de fazer personagens que normalmente a gente não recebe nem fazendo aula de teatro. Porque é sempre o branco que é o príncipe. Não tem preto príncipe, uma preta princesa. Eu já estou saturado de ficar sempre vendo essa mesma coisa. Você estuda muito pra ser sempre o filho da empregada no cinema, minha mãe é doméstica, eu não preciso estudar muito pra saber como é ser o filho da empregada, porque eu já sou. É para sair dessa realidade que a maioria vive e até mostrar que a gente é capaz de fazer outros personagens”, desabafa.
Curiosidades do elenco
O elenco tem oito atores e, em média, são 20 pessoas envolvidas na produção. Nem todos tinham contato com cinema ou teatro, como Paula Vieira que estrou como atriz em No Sigilo. “Primeira vez que eu fiz, porque ele [Victor Marinho] gosta de recrutar talentos. Somos amigos desde criança e ele sempre recrutou todo mundo aqui para ser ator, dessa vez ele me recrutou”.
Segundo Victor, interpretar papéis de pessoas homofóbicas foi desafiador. “A maioria do elenco é gay e quando eles foram fazer personagens que atingiam outro gay eles ficaram incomodados, porque de certa forma atingiam eles. Então teve muito aquela coisa de ‘entender que não sou eu’, querendo ou não, todo mundo saiu da zona de conforto”.
Bastidores do filme
As gravações foram no Morro da Primavera, em Cavalcanti, zona Norte do Rio de Janeiro, e levou, em média, três semanas de filmagem e três de edição. O filme já bateu mais de 14 mil visualizações e a produção está analisando o retorno do público para avaliar a possibilidade de continuação do longa.
Victor Marinho conta sobre a reação dos moradores durante a gravação: “O pessoal gosta porque estamos fazendo uma coisa de diferente, não estamos de bobeira na rua se misturando com coisa errada. Tem sempre umas pessoas que ficam retraídas pelo fato da gente levantar a bandeira LGBTQIA+, ai tem essa questão. Antes as pessoas passavam fazendo graça, barulho, buzinando, depois que viram a proporção mudaram a visão e entenderam que não era para atrapalhar e quem fica na janela até bate palma. As pessoas aos poucos vão apoiando”.