A psicóloga Thais Marques, de 31 anos, chegou de tranças para fazer a retirada de melanócitos que tem no rosto, na última sexta-feira (12), no Hospital Federal de Ipanema, Zona Sul do Rio de Janeiro. Ela não foi informada de que não poderia estar de tranças para o procedimento, mas conta que a médica Maria Paula Rochedo disse que a paciente deveria tirar “esse troço”, repetidas vezes, para continuar o atendimento. “Não é troço, é trança”, corrigiu Thais, que foi ignorada. Mulher preta e moradora de Olaria, Zona Norte, ela disse ter entendido do que se tratava: racismo. Foi quando fez a reclamação à ouvidoria do hospital e, no mesmo dia, denunciou o caso na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), que está investigando. O Ministério da Saúde se pronunciou, alegando que repudia todo e qualquer ato racista e que o caso será apurado.
A consulta estava marcada para às 8h da manhã do dia 12 de julho. “Cheguei às 07h30 e 12h fui atendida pela médica Maria Paula Rochedo, que começou a se referir às minhas tranças como ‘coisas’ e ‘troço’. Ela disse que eu precisava tirar ‘aquilo’ senão correria o risco de pegar fogo. Mas falou de uma forma muito hostil e racista. Neste momento, fiquei com nó na garganta, não acreditando no que eu estava escutando”, relata Thais.
“Ela tentou amenizar sua fala dizendo que tinha uma médica branca que utilizava tranças. Após isso, Maria Paula continuou se referindo às minhas tranças como ‘troço’, dizendo que não daria para fazer o procedimento se eu estivesse com as minhas tranças e que poderia ser arriscado. Inicialmente, pensei que pudesse ser um cuidado, mas logo em seguida, por ser uma mulher atenta, instruída e informada, entendi que se tratava de racismo.”
Thais relembra que ao pontuar sobre o risco de fazer, utiliza mais uma vez a palavra ‘troço’ para se referir às suas tranças. “Digo à ela que não é troço e sim tranças, e ela repete a palavra troço, mesmo diante da minha insatisfação.” No consultório da médica havia mais uma profissional, que a paciente não perguntou o nome, porque, àquela altura, já estava tomada por muitos sentimentos. “Parecia ser auxiliar, que também estava tentando me convencer que precisaria retirar minhas tranças para fazer o procedimento, alegando que correria o risco de pegar fogo.”
Thais, ao sair do consultório, conta que foi abordada por uma profissional da administração, que a perguntou se ela queria marcar o procedimento com alguma outra profissional. “Eu não consegui respondê-la, só queria sair daquele ambiente e fui tomada por uma angústia, tristeza e aflição. Essa profissional da administração me instruiu a ir na ouvidoria do Hospital. Lá, fui atendida pela Renata, que me orientou a fazer o relato por e-mail.” A paciente realizou todos os trâmites, mas ainda não obteve uma resposta.
Ministério da Saúde
Acionado, o Ministério da Saúde se pronunciou, alegando que “repudia todo e qualquer ato que envolva racismo e injúria racial. O caso citado pela reportagem será devidamente apurado. A pasta reitera que o Sistema Único de Saúde (SUS) é para todas as brasileiras e brasileiros, e nosso compromisso é com um atendimento em saúde digno, respeitoso e igualitário”.
Polícia Civil
Em nota, a Polícia Civil informou que “os agentes buscam possíveis testemunhas e realizam diligências para elucidar os fatos”.