Dos mais de 203 milhões de habitantes do Brasil, cerca de 16 milhões são moradores de favelas (Censo 2022). Ainda assim, as políticas públicas de urbanização não atendem a essas pessoas como atendem, por exemplo, na Zona Sul carioca. Parafraseando o geógrafo David Harvey: “o direito à cidade como ele está constituído agora, está extremamente confinado, restrito na maioria dos casos à pequena elite política e econômica, que está em posição de moldar as cidades cada vez mais ao seu gosto”.
De acordo com o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ), Sydnei Menezes, o grande problema dos projetos urbanísticos pensados para espaços como favelas e periferia é o abandono. “Não houve, não há e não sei se um dia haverá política de continuidade. O que é? Planeja, executa e mantém”, explica. Pontuando, ainda nessa esfera, que “a pior coisa é refazer obra”. Isso se daria justamente pela não continuidade de um projeto de urbanização.
“O que você vai encontrar lá [nas favelas que receberam projetos de urbanização]? Rigorosamente, a favela como era antes da intervenção. Alguma coisa tá errada. Alguma coisa não deu certo nessa história”, afirma Menezes.
O que Harvey fala sobre o direito à cidade, Menezes concorda. A favela não é considerada, de fato, como parte da cidade pelos governos. Na verdade, ele pondera ser além disso. “Eles acham que o problema está resolvido. Darcy Ribeiro dizia isso; que favela é solução. A solução que o povo encontrou para a omissão do governo.” E por quê? Porque, assim, se economiza recursos para investir em outras áreas que considera mais vantajosas para o poder público”, critica.
E, quando é falado sobre o não direito à cidade, é possível lembrar de um exemplo recente de quando, nas Olimpíadas que aconteceram no Rio, em 2016, as favelas cariocas foram retiradas do mapa oficial da cidade. No entanto, não foi uma ação isolada. “Na década de 70, as favelas eram espaços em branco nos mapas”, relembra Menezes.
Urbanismo climático
O urbanismo climático seriam os princípios básicos da arquitetura, segundo o presidente do CAU. “Ventilação, insolação e iluminação. Então, para ter um bom resultado, você tem que ter um ambiente que tenha esses três. Então, toda essa questão climática que se discute hoje é a partir disso, desse equilíbrio que deve ser encontrado na realização dos projetos e intervenção dos espaços públicos. Para, assim, conseguir a qualidade de vida e a sustentabilidade”, explicou.
Planejamento urbano e prioridade de permeabilidade do solo são duas coisas que faltam. Um exemplo que, “climaticamente” falando, não é o ideal foi o recente asfaltamento do Morro da Providência, que é pavimentado com paralelepípedos. “Quando chove, parte é absorbida pelo solo. Com asfalto não. A chuva bate no asfalto e vira um rio; se for uma via inclinada, você vai ver uma cachoeira no final.”