Patricia Cavalcanti Lobaccaro – Presidente e CEO da BrazilFoundation, organização internacional que mobiliza recursos para projeto sociais no Brasil. twitter: @patcaval
Grande parte das pessoas que conheço jamais esteve em uma favela. Por medo, preconceito, ou quaisquer que sejam os motivos, o fato é que isso é uma pena. Através do trabalho na BrazilFoundation, tive oportunidade de conhecer alguns desses territórios, fascinantes e complexos, que assim como a planta que deu origem ao nome, tem espinhos, mas lindas flores.
Na Providência, primeira favela da América La na, conheci a Casa Amarela, que fica no topo do morro e abriga uma exposição espetacular de fotos que retratam a história e a memória da favela. Os gatos de eletricidade e de água (sim, de canos de água!) lado a lado com obras do artista Vihls compõem um cenário que reflete o talento e capacidade de invenção humana, em duas versões.
No Morro dos Prazeres, a pintura feita na escadaria de entrada da favela que deu origem ao caminho do grafitti é a prova de que a arte pode revitalizar territórios e transformar vidas. Na Cidade de Deus, a brutalidade das marcas de tiro nas placas das ruas contrasta com um dos maiores exemplos de solidariedade humana, a generosidade de Maria de Lourdes que decidiu, ainda jovem, trazer dignidade aos idosos da comunidade. Na Grota do Surucucu, em Niterói, aprendi que Pachebel e samba podem dar liga – e que liga! No Alemão, o teleférico fica pequeno diante das lideranças jovens ultra conectadas, que dão voz à sua comunidade através da tecnologia, e são referências mundiais em ativismo digital.
Ainda faltam serviços básicos, equipamentos culturais, oportunidades. A presença do Estado infelizmente não é mensurada pelo número de creches, escolas, hospitais ou áreas de lazer, mas fica muitas vezes visível através de tanques e armas de alto calibre. Essas adversidades, no entanto, geram resiliência, capacidade de inovar, e solidariedade cada vez mais escassa nos bairros e condomínios nobres.
Nas favelas estive com algumas das pessoas mais inteligentes, articuladas e comprometidas que conheci na minha vida, o que considero um presente e um privilégio. Diante deles me sinto humilde, e com eles aprendo em cada encontro, em cada oportunidade de troca.
Tenho dedicado os últimos 13 anos da minha vida a tentar criar pontes entre mundos que não convivem; gerar colaboração e diálogo, e reduzir estigmas, que existem dos dois lados. Sonho com o dia em que os brasileiros possam prestar mais atenção no que nos torna iguais, nas semelhanças, nos sonhos e aspirações comuns. Sonho com o dia em que o CEP onde você nasceu não mais será fator que determine que tipo de oportunidade vai ter na vida, e que a diversidade seja vista como riqueza, e não como um problema.