Em meio à crise do coronavírus empreendedoras da favela persistem no sonho e geram oportunidades de trabalho

À frente das lojas Gloria´s, família do Complexo do Alemão se enquadra nas novas normas em combate à Covid-19 , multiplica o número de seguidores nas redes e abre novas filiais.

No momento em que as palavras pandemia, quarentena, isolamento social, flexibilização e coronavírus causam preocupação na população, outra palavra pode nos causar medo e insegurança: futuro. E como pensar no futuro, se o agora é tão incerto? Como pensar em investir, manter e gerar lucros em meio de uma crise que se estende por quatro meses? Como pensar no empreendedor local, faturando, gerando rendas e empregando moradores? Difícil né!? Mas no Complexo do Alemão encontramos uma família liderada por mulheres empreendedoras, que estão fazendo a diferença e mostrando que em meio à crise podem sim enxergar uma grande oportunidade.

Registro da demolição da primeira loja Gloria’s.
Foto: acero pessoal

Um sonho de mãe e filha, que envolveu a família toda, que são moradores do morro do Adeus, no Complexo do Alemão, e que há 8 anos é referência no mercado feminino dentro da favela. Estamos falando da loja loja Gloria’s, localizada na Nova Brasília, que já passou por muitas histórias de luta e perseverança, mas nada comparado à crise do coronavírus. A loja que já foi demolida no passado quando atendia no muro da antiga fábrica da Tuffi e teve a conta hackeada ano passado, tendo que recomeçar do zero, teve que se enquadrar nas novas normas em combate à Covid-19 para não fechar as portas. Hoje, o negócio tem 7 funcionários, 3 lojas no Complexo do Alemão, 2 no Jacarezinho e o objetivo de ter mais lojas em mais favelas, gerando emprego para moradores. 

Em conversa com uma das proprietárias da loja, Glória Stéfani nos fala como está sendo esse período de pandemia, pois além de atender aos moradores, a loja recebe pessoas de outros bairros.

Uma das características da Gloria’s nessa pandemia foi o aumento de número de acessos nas redes, com um serviço personalizado, atendimento on-line eficiente, uma conta no Instagram com atualizações diárias e parcerias com blogueiras, maquiadoras e influenciadoras locais. O número de acesso nos últimos meses mais que dobrou e fez da loja uma grande referência em artigos femininos. O que fez com que nesse período de pandemia o negócio ganhasse mais visibilidade e abrisse mais duas lojas, mais uma na entrada da Brasília e mais uma no Jacaré. “Não esperávamos esse sucesso todo, eu acho que todo camelo tem um sonho de ter uma loja, e nossa família está vivendo esse sonho, o nosso objetivo é ter uma Gloria’s em cada favela.”

Quando houve o decreto para o fechamento do comércio, a Gloria’s se manteve fechada. Infelizmente, tiveram que liberar funcionários, pois não teriam como suprir salário, e isso causou um impacto grande no faturamento, gerando um medo muito grande do desconhecido. Mas elas não quiseram acreditar que isso tudo que estava acontecendo só traria coisas ruins e começaram a pensar como poderiam “fazer desse momento uma nova oportunidade.”

Glória avalia que para o comércio o ponto negativo foi como a pandemia chegou rápido no Brasil e como se proliferou dentro da favela. O comércio não estava preparado, e muitas empresas e lojas fecharam as portas até mesmo dentro da favela por não ter como pagar os boletos, funcionários e o aluguel, gerando uma tensão enorme. Em contrapartida, ela consegue destacar a união dos moradores e como eles abraçaram o comércio, dando preferência ao comércio local (comerciante, serviço), e isso foi o que deu “um gás” para que elas persistissem. “É a favela, um ajudando o outro, dando preferência não só para a nossa loja, mas para o sacolão local, mercadinho dentro da favela, essa união que nos ajudou ”.

Mesmo com a reabertura do comércio, ainda é nítido o impacto da pandemia, que ainda não acabou. Exemplo disso é o reabastecimento da loja, Glória relata que há muita demora na entrega de mercadorias, que fornecedores ainda não voltaram 100% e que elas tentam buscar manter o preço dos produtos, procuram o melhor preço com outros fornecedores que já estão ativos. E além de manter um preço acessível em seus produtos, elas visam o bem estar dos clientes com medidas de proteção tanto para elas, quantos para os consumidores: “Nós higienizamos a loja todos os dias, usamos máscaras, álcool em gel, mantemos a distância e estamos colocando limite de pessoas dentro da loja para evitar aglomerações. Como as lojas são pequenas, permitimos apenas de 3 em 3.”

Com a abertura de mais lojas elas conseguiram recontratar funcionários e querem ir além: “O maior desejo do pós pandemia é ter uma Gloria’s em cada favela, gerando mais oportunidades de emprego, enquanto a pandemia não passar, a caminhada é com muita fé e acreditando em Deus para que esse período passe rápido”. E que a força dessas mulheres e da sua família, inspire empreendedores que pensam em desistir, esse período já vai passar, e o comércio vai conseguir se reerguer. É a favela se reinventado e se ajudando nesse período de pandemia.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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