Precisamos cuidar da nossa cidade. O ato de cuidar é uma sabedoria que vem do povo negro, em especial das mulheres e dos povos originários. Infelizmente, essa ação e esse conhecimento são desvalorizados pelo nosso sistema. Cuidar é sempre uma tarefa coletiva.
Um provérbio africano diz que “é necessário uma aldeia inteira para educar uma criança”. Educar é uma das formas de cuidar e exige responsabilidade de muitos e muitas. Imagine então o desafio de cuidar de uma cidade?
Falamos do cuidado como ato político, como forma de gestão de Estado, que olha o poder não como uma ponte para o favorecimento pessoal, e sim para servir ao público. Nesse sentido, existem políticas públicas sendo pensadas a partir de um sistema integrado de cuidado, inclusive do ponto de vista econômico, motivadas pela Organização das Nações Unidas.
Cidades são construídas por pessoas e podem ser mudadas. Nós circulamos pelas cidades e nelas acontecem os encontros. No entanto, há cada vez menos espaços comuns e de troca, embora a cultura siga resistindo. Se conseguirmos motivar pequenas mudanças locais, motivamos a esperança em mudanças globais.
Nas cidades, o contraste e as desigualdade são nítidos: de um lado instituições ricas e que geram lucro e do outro uma população pobre, desempregada, passando fome e que é alvo da violência. Há também muitas denúncias de crimes ambientais em diversos territórios.
Cuidar da natureza é fundamental, cuidar de quem a protege também. Nas regiões que são alvos de desmatamentos ilegais, a fome é uma crescente. Portanto, é preciso fortalecer políticas públicas do sistema de assistência social investindo no campo– em especial na agricultura–, que gera alimentos que chegam à mesa do povo, às creches e escolas públicas por meio da merenda escolar. Porém, para isso acontecer é necessário pensar com cuidado a gestão dos recursos.
Falando em recursos, ver saúde e educação como investimentos básicos é fundamental para o cuidado. Destacamos aqui as creches e escolas, um dos poucos aparelhos públicos presentes nas periferias e favelas, e que cumprem um papel fundamental de cuidar das nossas crianças e adolescentes.
Precisamos de mais creches. Estudar tem que ser atrativo para que os filhos e filhas dessa pátria mãe gentil possam aprender e concluir o ciclo completo dos estudos.
É preciso acreditar na potência que vem das favelas e periferias, e não vê-las como lixo a ser removido, pois vemos muitas soluções sendo produzidas por elas. Uma delas é a criação da COP das Baixadas em uma das periferias mais populosas de Belém do Pará, no bairro do Jurunas.
A casa lilás de dois andares, construída em madeira, guarda uma prática de cuidado e movimentação coletiva que parte do livre acesso à leitura e do encontros de pessoas e organizações.
Foi nesse espaço, chamado de Gueto Hub, que nasceu a ideia de realizar a COP das Baixadas, evento-piloto de conferência do clima feito pela e para a periferia, construído pelas mãos de várias organizações comunitárias e coletivos de Belém e que tem como objetivo principal colocar a periferia no centro do debate climático.
Um exemplo prático de cooperação em rede que visa aproximar a discussão climática mundial do cotidiano das pessoas, incentivar o protagonismo dos jovens frente ao ativismo climático, além de chamar a atenção de autoridades públicas sobre a necessidade de debater com as comunidades impactadas pela crise climática.
Nesta primeira edição, foram definidos três eixos principais de discussões: Direito à Cidade – Mobilidade, adaptação e políticas públicas; Comunicação – Artivismo e intervenção artística como conscientização nas periferias; e Clima e Sociedade – Impactos nas periferias, soberania alimentar, alagamentos, deslizamento e migração.
Temas que serão abordados por atrações artísticas, debates e feira criativa. A programação virtual iniciou-se nesta quinta (9) e segue na sexta (10), com transmissão no canal do YouTube do projeto Telas em Movimento. Encerra-se no sábado (11), com um Fórum de Desconferência, de forma presencial, na Usina da Paz Jurunas, em Belém.
O que é uma COP?
A chamada “Conferência do Clima” (COP) da Organização das Nações Unidas (ONU) é o maior encontro realizado no mundo sobre as mudanças climáticas. Tem como objetivo discutir o clima e, principalmente, tomar decisões sobre essa urgente necessidade. Por causa dessa relevância, a sociedade civil tem cobrado maior participação nas decisões tomadas pelos líderes governamentais. Lideranças periféricas, negras, indígenas, quilombolas e ribeirinhas constantemente pleiteiam este espaço, já que as mudanças climáticas atingem diretamente seu dia a dia.
A cidade de Belém é a capital do Pará e foi escolhida pelo atual presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como candidata para receber a próxima Conferência do Clima (COP30), programada para ocorrer no ano de 2025. Se depender das periferias, estaremos lá construindo a conferência que queremos!
Wesley Teixeira: Morador da Baixada Fluminense, integrante do PerifaConnection, da Coalizão Negra por Direitos e da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito
Joyce Cursino: Fundadora da Negritar Filmes e Produções (PA)