Em 2022, o Brasil tinha mais de 1,5 milhão de trabalhadores que atuavam em aplicativos de serviços. Esse número, de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, representava 1,7% da população ocupada no setor privado no país.
O número é bastante expressivo e por isso o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 12/2024, resultado de um grupo de trabalho implementado no ano passado, para dialogar sobre propostas que atendessem aos trabalhadores do setor. O projeto, em caráter de urgência, movimentou a categoria que protestou pelo país nas últimas semanas.
A categoria, hoje sem regulamentação, seria considerada para fins trabalhistas como trabalhador autônomo de aplicativo, devendo recolher impostos de seguridade social, bem como o estabelecimento de um salário mínimo e limite de jornada de trabalho. As ações propostas não surtiram o efeito positivo que era esperado pelo governo.
As plataformas surgem no país para intermediar um serviço que até aquele momento já existia, o chamado delivery. Na promessa de ser um serviço exclusivo, prático e barato, hoje os carros de aplicativo não tem tanta diferença das modalidades que já usamos. Enquanto isso, as plataformas, cobrando parte do valor, enriqueceram sem ofertar o mínimo de direitos aos trabalhadores.
Na premissa de produzir empreendedores, donos do seu próprio tempo, com autonomia, essas plataformas se isentaram de suas responsabilidades. Quando o motorista sofre um acidente enquanto faz uma entrega, ele próprio arca com as consequências, já que a plataforma diz que ele não é um funcionário, o estabelecimento alega estar utilizando um serviço, e o consumidor é o elo mais distante dessa relação.
Todo o acúmulo de direitos trabalhistas conquistados ao longo das últimas décadas, provenientes da luta e mobilização dos trabalhadores, parece não interessar a maior parte da categoria. Uma dinâmica diferente de relação de trabalho, fundamentada na fragilidade e no discurso de autonomia. Acreditar que o livre mercado seria o suficiente para equalizar essa relação é ser demasiadamente ingênuo.
O projeto de lei também estabelece uma jornada máxima diária de 12 horas que tem sido alvo dos críticos do projeto. Cabe ressaltar que uma jornada máxima é importante para garantir a segurança dos passageiros. Ultrapassar esse limite pode resultar em maiores ganhos, porém incorre em perigo para quem está no automóvel e nas ruas.
A regulamentação é necessária para estabelecer o mínimo de garantia de direitos aos trabalhadores. Quanto ao formato estabelecido, com valores mínimos, jornada de trabalho estipulada, pode não ser o melhor para quem acredita que está empreendendo, quando na verdade é mais um trabalhador precarizado. Contudo, é importante estabelecer melhor as regras do jogo, considerando inclusive as novas modalidades de trabalho.
VINI MACHADO
Coordenador-Geral de Promoção de Direitos da População Negra na Secretaria de Acesso à Justiça, no Ministério da Justiça e Segurança Pública. Formado em Geografia pela UnB trabalha com educação e direitos humanos. Líder do Mapa Educação e Coordenador da Politize em Brasília. Fundador da Rede de Cursinhos Populares do Distrito Federal e Entorno. Sou cofundador do Projeto Tem Cor no Ensino.