Passos firmes, o olhar atento, fala pausada, e cada palavra bem pensada. “O seguinte é esse: O ‘sabido’ não berra, e quem faz não diz” ensina seu Severino Luiz dos Santos, de 96 anos, nascido em 20 de outubro de 1927.
Cercado de suas filhas, que são os seus tesouros, sentado na sua poltrona no canto da parede de sua casa, localizada nas proximidades da grota, ele conta orgulhoso sobre seus mais de 30 anos de vaqueiro veterinário, dos dias que viveu fazendo partos de bezerros, laçando gado, aplicando vacinas, cuidando do pasto. “O cavalo tem lugar certo de vacinar, o boi não.” explica.
Seu Severino se casou aos 21 anos e viveu 60 anos ao lado de Dona Maria dos Santos, falecida há 14 anos completados no dia 21/02, data desta entrevista. Com respeito e muito orgulho, ele lembra dela e de como cuidou da casa e dos filhos. Foi com a dona Maria que ele teve 16 filhos, mas destes apenas 6 ficaram vivos. Eram outros tempos, sem acesso a vacinas, acompanhamento médico e remédios.
Seu Severino traz a sensação de estar na Paraíba, falando de Tananduba, sítio na cidade de Guarabira onde trabalhou e de Bananeiras, cidade do interior onde nasceu, localizada a 127 quilômetros da capital do estado, João Pessoa.
Seu Severino é uma história viva. Veio à “cidade maravilhosa” cinco vezes. A primeira foi em um pau de arara, caminhão com bancos de madeira sem conforto, nem segurança, que muitas vezes quebrava na estrada e era preciso os próprios passageiros empurrar. “Era novo, tudo era fácil”, ele diz. Para criar seus filhos, trabalhou também como servente de pedreiro em obras na Barra da Tijuca e Copacabana, e enviava cartas para manter o contato com sua família. Quando a obra acabava e a saudade apertava, voltava para casa, onde trabalhava também nas plantações, “na enxada”, como conta.
Foi assim também que criou seus filhos, ensinou a cultivar a terra e dela colher os frutos suficientes para viverem, com a agricultura de subsistência. Aprendeu muito, sem saber ler nem escrever. Ele diz que foi criado sem seu pai de quem sente falta. Teve uma mãe que precisou ter pulso forte para criar os filhos e trabalhar.
A vinda para o Complexo do Alemão aconteceu naturalmente. Depois que suas filhas vieram, já idoso, vendeu seu terreno na Paraíba e se mudou com a esposa para o CPX. Hoje não pensa mais em voltar para o nordeste. O irmão e um filho ainda moram lá. A alegria que tem agora é morar sossegado em sua casa, onde faz sua própria comida, assiste aos jogos do Flamengo, time que torce desde jovem. Um dos maiores jogadores na opinião de Seu Severino é o atacante Pedro, camisa 9. O Flamengo é um dos únicos motivos que fazem ele dormir depois das 21h. A outra paixão é ouvir forró no rádio. Timidamente ele diz que não dança mais “porque as pernas não aguentam”, mas quando ouve o som da sanfona, arrasta o pé mostrando domínio na dança.
Enquanto tudo isso acontecia, durante nossa conversa de uma hora, as filhas Conceição dos Santos, de 68 anos, e Maria dos Santos, Dona Céu, a caçula de 61 anos, com os olhos brilhantes e sorrisos largos, contam o quanto o amam e a felicidade de ter o pai ao lado com saúde.
Aos mais jovens e leitores, o vaqueiro finaliza desejando bênçãos, afirma convicto que a sabedoria já temos, e que se a gente pode ler estas palavras que o mundo está ao nosso alcance. Seu Severino diz que vai levar consigo os aprendizados de mais de 30 anos de trabalho; já que não tem para quem ensinar. Mas, se ‘o sabido’ não fala, aqui peço licença para finalizar dizendo que: mais sábio é ele, porque escolhe o que dizer. Vida longa ao Seu Severino!