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O lugar do pobre na universidade: políticas sociais e ações afirmativas

Avanço nas instituições de educação vem de ampla mobilização dos movimentos populares
Mobilização de estudantes: em 2021, a Universidade Zumbi dos Palmares lançou o Movimento Nacional Cotas Sim!, com o objetivo de renovar a lei de cotas, uma vez que seu prazo de validade de 10 anos termina em agosto de 2022 (Crédito: Antonio Scarpinetti/Unicamp)
Mobilização de estudantes: em 2021, a Universidade Zumbi dos Palmares lançou o Movimento Nacional Cotas Sim!, com o objetivo de renovar a lei de cotas, uma vez que seu prazo de validade de 10 anos termina em agosto de 2022 (Crédito: Antonio Scarpinetti/Unicamp)

Por: Wesley Teixeira e Ricardo Lodi para Folha de S.Paulo

Neste ano, celebramos 20 anos de implementação das ações afirmativas na UERJ (Universidade do Estado do Rio Janeiro) e dez anos da aprovação da lei federal que instituiu essas políticas nas universidades federais brasileiras. Fruto de uma ampla mobilização e pressão de movimentos populares, negros e antirracistas, em articulação com os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, as cotas transformaram radicalmente o perfil do corpo discente das instituições públicas de ensino superior no Brasil.

Hoje, esses espaços são mais democráticos, populares e coloridos. Muitas vezes, os estudantes cotistas, grande parte deles negros, são os primeiros de suas famílias a ingressarem nesses ambientes. É notório o sucesso das ações afirmativas, contribuindo para que a presença de pobres no ensino superior público crescesse exponencialmente. Essa ampliação não afetou a qualidade do ensino, argumento utilizado por movimentos anti-cotas, já que cotistas têm em média um desempenho acadêmico similar ou superior aos não cotistas.

As cotas surgem em um contexto de maior consolidação de políticas sociais. Destacamos o Bolsa Família, a política de valorização do salário mínimo, Prouni (Programa Universidade para Todos), o Minha Casa, Minha Vida, o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), entre outros. Tratam-se de iniciativas com objetivo explícito e bem definido de colocar os mais pobres no orçamento público, utilizar os recursos do Estado para enfrentar as desigualdades raciais e sociais persistentes no país e efetivar os direitos assegurados pela constituição de 1988.

O combate às desigualdades educacionais é importante para a realização profissional e social dos indivíduos e, por isso, sempre esteve entre as principais preocupações da sociedade civil organizada. Dessa forma, as cotas precisam ser combinadas a outras políticas de permanência estudantil, como a garantia de bolsas de pesquisa e de extensão e os auxílios de moradia, transporte e alimentação.

A nossa UERJ, pioneira nas políticas de democratização do acesso e permanência estudantil, enfrentou, na última década, uma crise financeira profunda diante do desastre administrativo e econômico do governo de Sérgio Cabral. Além disso, a instituição recebeu ataques de setores aliados do atual governo federal na assembleia estadual, com ameaças e tentativas de desestabilização institucional e propostas de projetos de lei visando o fechamento da universidade.

Nos últimos anos, de uma forma geral, as universidades brasileiras têm sofrido com um estrangulamento financeiro decorrente dos cortes promovidos pelo Ministério da Educação e pelo governo federal, inicialmente com Temer e, agora, aprofundados com Bolsonaro. São os setores antidemocráticos buscando reverter décadas de avanços educacionais.

Por meio de muita luta, a comunidade acadêmica e aliados dentro das instituições políticas, como a própria Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro), estão superando dia após dia cada dificuldade colocada para o funcionamento das universidades.

Durante a pandemia, a UERJ buscou minimizar os impactos dela decorrentes criando novos auxílios para combater a evasão estudantil. Disponibilizou cotas de apoio digital, distribuiu 10 mil tablets e 12.000 chips de internet para alunos com renda de até dois salários mínimos, implementou novos convênios para estágios e novas bolsas para alunos e professores darem continuidade às pesquisas, extensões e projetos culturais. A Pró-Reitoria de Políticas e Assistência Estudantis ofertou para os alunos auxílio-alimentação (R$ 300), bolsa permanência para pós-graduandos (R$ 600), auxílio-transporte (R$ 300), bolsa de apoio à vulnerabilidade social (R$ 600) e auxílio-creche (R$ 900). São milhares de alunos negros e pobres beneficiados por essas ações.

Quando transformamos a universidade, transformamos a vida de milhares de brasileiros. Ela é espaço de promoção cultural, produção e troca de conhecimentos, além de símbolo de enfrentamento às profundas desigualdades raciais e sociais que estruturam a sociedade brasileira.

A universidade é do povo!

Wesley Teixeira
Morador da Baixada Fluminense, integrante do PerifaConnection, da Coalizão Negra por Direitos e da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

Ricardo Lodi
Reitor e professor do programa de pós-graduação em direito da UERJ

PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias, é feito por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento. Texto originalmente escrito para Folha de S.Paulo

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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