O mês de outubro é recheado de datas comemorativas, entre elas, o Dia Nacional da Poesia. O último dia desse mês é dedicado a esse gênero literário tão comum no cotidiano da favela, desde as letras de canções até o papo reto dito nas rodas de slam.
A data foi oficializada em 2015, através da Lei 13.131/2015, pela então presidente Dilma Rousseff, em homenagem ao nascimento de Carlos Drummond de Andrade. O poeta mineiro viveu a maior parte da vida no Rio de Janeiro. Comprometido com as questões sociais de seu tempo, publicou em 1984 o poema Favelário. Os versos falam da chuva de 1966 (que causou estragos em várias favelas), urbanização e remoção. O poema inicia com uma pergunta: “Quem sou eu para te cantar, favela…?”
Cida Costa, 41 anos, a quem o poeta serve de inspiração, não tem dúvida da autoridade que carrega em si para cantar sua favela. Cria do Vidigal, a atriz e poetisa tem o seu lugar como tema.
“Eu escrevo sobre as coisas que eu vejo, sobre as coisas que eu sinto, o que faz parte do meu cotidiano. Quando teve a guerra aqui no morro, eu não podia sair de casa; então, eu escrevia. Eu escrevo como um fluxo de mim mesma. Escrevo sobre o meu lugar. A favela é poesia, é uma grande boca que nunca se cala. É a conversa que perpassa a parede do vizinho. É a música que toca em cada casa. É um tudo que fala”, afirma Cida Costa.
Embora tenha a favela como tema mais comum, a poesia de Cida Costa também trata de questões existenciais.
“A poesia é onde eu consigo organizar minhas ideias. A poesia é a minha cura porque ela expressa o que eu penso, se materializa quando eu falo. Com a poesia eu posso brincar com as emoções, com o tempo e espaço. Ali eu me sinto inteira.”
Bruno Barboza, 34 anos, ator, é presença frequente nos saraus que acontecem no Vidigal. Embora também escreva poesias, costuma emprestar seu talento para a leitura interpretativa de versos de outros autores.
“Uso a palavra dita como ferramenta para me descobrir e me comunicar com os outros. O ser humano se conecta com a violência porque não sabe materializar a dor. A poesia faz isso. Eu declamo vários poetas não porque os decorei, mas porque me salvaram em uma manhã de quarta-feira. Sou exposto através de obras. Ao anunciar um poeta, me anuncio”, diz Bruno Barboza.
Morador do Vidigal, Bruno, que nasceu no interior do estado, descobriu o amor pela poesia através das aulas de teatro do grupo Nós do Morro, assim como Cida Costa.
“Minha infância foi regada a amor e livros. Meu relacionamento com a palavra é existencial. A palavra limita, mas faz existir. Aprender a ler e a escrever é a maior aventura que o ser humano pode vivenciar. Eu conheci a poesia desde muito pequeno, mas foi na favela do Vidigal que a poesia virou conversa”, comenta Bruno.