Vinícius Silva de Souza durante muitos anos representou a seleção brasileira no karatê. Hoje, aos 39 anos, reconhecido como Vinny Santa Fé, ele está fazendo parte da história do Brasil de outra maneira: através do samba. Nascido e criado em Vila São Luiz, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, o sambista vai estrear no Rock in Rio, no palco do Espaço Favela, no mesmo dia dos clássicos Fundo de Quintal e Xande de Pilares.
Sua primeira composição, “Castelo de um quarto só” foi gravada primeiramente por Renato da Rocinha, em 2018, e acumula mais de 46 milhões de visualizações no Youtube. A canção já foi performada por Ferrugem e Marcelo D2 para o programa Música Boa Ao Vivo, da Multishow. Com a grana desse sucesso, Vinny Santa Fé foi gravar outra composição sua, que escreveu durante a pandemia. “Eu estava enlouquecendo. Não tinha nada para fazer, juntei um dinheiro que eu tinha ganhado com ‘Castelo’ e fui para o estúdio gravar a música. Era a Pauperrecido”, que hoje tem mais de 1 milhão de visualizações na plataforma de vídeos e foi regravada, há dois anos, com o grupo Bom Gosto.
Mas, até ele se descobrir enquanto artista, sua vida desmoronou. Em decorrência de uma lesão no joelho, Vinny teve que encerrar sua carreira consolidada de atleta. O compositor nato só começou a enxergar como profissão o samba, “que não chegou, sempre esteve ali, como uma árvore no quintal”, aos 31 anos, “já velho”. Não era. Aquilo que, como ele disse, sempre esteve ali, no quintal de sua casa, com sua família de artistas declarados e anônimos, viria a ser seu caminho e atingiria milhões de pessoas. Até relembra: “A música fez parte da minha infância de forma lúdica. Nunca cantei profissionalmente, mas lá em casa tinha o quintal do fundo, onde ficava a geração da minha vó cantando seresta, e o quintal da frente, com a geração da minha mãe, cantando samba.” Era muito repique e Jorge Aragão.
Junto ao samba, ele se encontrou em sua religião. “Sou macumbeiro, filho de Oxossi e Exu”, declara, com orgulho. A umbanda salvou Vinny Santa Fé, junto do samba. No dia que saiu a gravação de “Castelo de um quarto só”, ele estava cumprindo obrigação no barracão para seu orixá. “Só me dá um caminho para eu viver que eu não aguento mais isso”, foi o que ele pediu. Desde que saiu da seleção brasileira, se viu atravessado pela falta de saúde mental. “O esporte me blindou durante muitos anos, mas foi quando eu saí que eu entendi o que era ser preto e pobre.”
Foi com o choque de realidade que ele entendeu seu dom para a composição. Desde pequeno, o artista tinha afinidade com as palavras. “Escrevia muita cartinha de amor”, como bom sambista. No entanto, Vinny revela sobre suas letras: “Eu não escrevo quando eu quero. É algo mediúnico. ‘80 tiros’ eu escrevi no dia que aconteceu. E foi nesse dia que eu parei de ver televisão. Nunca tinha ficado tão mal por alguém que não conhecia. Eu chorei, fiquei puto, gritei…”
O compositor revela, também, que a letra mais bonita que já escreveu veio através de um sonho. “Eu estava na rua e tinha um pagode cantando longe. Eu fui seguindo o som para chegar na tal da festa que tocava a música bonita, que não existia. Quando eu cheguei no lugar, todo mundo de branco, de mãos dadas. Aí, um cara olhou para trás e falou: ‘vamos parar de cantar que ele chegou’. Eu acordei na hora.” Assim nasceu “Até depois do fim”.
É este o artista que vai abrir o palco do Espaço Favela no primeiro dia do segundo fim de semana de Rock in Rio; com muito axé, protesto e alegria. Diz ele que só se emociona quando assiste ao show depois. E não lembra de nada. “Acho que algum troço desce que toma conta de tudo e eu só lembro dos flashes”, finaliza. Antes, dá um spoiler: vai ter trap.