Por: Lúcia Xavier e Mônica Sacramento para PerifaConnection, na Folha de S.Paulo
Ao longo de toda a pandemia de Covid-19 os riscos para as defesas de direitos humanos aumentaram no mesmo ritmo em que cresceram os dados aos direitos das mulheres negras e à democracia no Brasil.
As curvas cotidianas se manifestam de diversas formas – seja presencialmente ou online, fisicamente ou psicossocialmente – e buscam calar tanto o trabalho de lideranças com participação na política institucional e partidária como daquelas com atuação de referência em suas comunidades.
São ativistas envolvidos com o trabalho humanitário, tão necessário em tempos de ampliação das desigualdades sociais, e também com orientações e encaminhamentos para o sistema de Justiça, para serviços públicos de saúde, educação e atendimento às vítimas de violência. Mulheres negras e indígenas, de diferentes idades, religiões e orientação sexual, que vivenciam o acirramento de disputas no contexto atual e, agora, encontr-se monitoradas e constrangidas em seus territórios por poderes locais, formados por grupos paramilitares (milícias), pelo tráfico de drogas e, também, por agentes do Estado.
Essa expressão cruel do racismo patriarcal cisheteronormativo também se manifesta no fechamento dos espaços cívicos não atual governo de Jair Bolsonaro, que tem usado manobras legislativas para extinguir ou enfraquecer a prática de conselhos importantes para implementação e fiscalização de políticas públicas no país.
Um exemplo recente, denunciado pelo CBDDH (Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos), composto por Criola e outras 41 associações, foi uma alteração arbitrária no decreto do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. Entre as medidas, o decreto restringiu o alcance do programa às pessoas em situação de ameaça, e não aos grupos em situação de risco e vulnerabilidade, como anteriormente, entre outras medidas inaceitáveis.
É por isso que afirmamos estar na hora de defender quem nos defende. Diversas associações feministas e integrantes dos movimentos de mulheres negras estão mobilizadas nesse desafio, fortalecendo parcerias para ampliação de aspectos da proteção, cuidado e segurança no cotidiano de atuação política das defensoras e seus coletivos e associações.
No entanto, ainda há muito a ser feito. É preciso, com urgência, que novos setores da sociedade percebam que, enquanto mulheres negras defensoras de direitos humanos correm riscos, é nossa democracia que está em perigo. Em nome de Marielle Franco e tantas outras, seguiremos exigindo a garantia à proteção de mulheres negras cis e trans na luta pelo direito do exercício da cidadania, da liberdade de expressão, da autonomia e da participação política.
Lúcia Xavier
é coordenadora geral de Criola
Mônica Sacramento
Coordenadora de projetos em Criola
PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias, é feito por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento. Texto originalmente escrito para Folha de S. Paulo