Quando chove na favela, não apenas os sons dos raios e relâmpagos causam medo. A população também fica amedrontada e alerta com o som das sirenes de chuva. Ouvidos ficam atentos para qualquer ruído diferente ou grito de socorro. Alguns moradores correm para pegar documentos e buscar abrigo em casas de parentes ou em pontos de acolhimento.
Essas estratégias de monitoramento tecnológico e ajuda comunitária podem ser chamadas de resiliência climática. O termo define ações que têm o objetivo de mitigar os danos causados pelas mudanças climáticas.
Segundo dados levantados pela Casa Fluminense, o Estado do Rio de Janeiro, na última década, foi responsável por 2/3 das mortes causadas por desastres ambientais em todo o país. A mesma pesquisa aponta que 2,1 milhões das moradias do estado são consideradas inadequadas. Sabemos que essa vulnerabilidade quanto aos impactos climáticos e habitação é mais evidente em territórios periféricos.
Tal clima de insegurança tem causado um medo crônico, denominado pela Associação Americana de Psicologia de ecoansiedade ou ansiedade climática. Trata-se de um transtorno causado pela preocupação com os impactos do clima.
No Vidigal, a cada chuva forte, o pavor dos moradores é despertado. Ainda é viva a memória dos estragos provocados pela tempestade de fevereiro de 2019, que vitimou uma moradora e resultou na remoção de moradores das áreas do Bagulheiro e da Jaqueira.
Obras de contenção estão sendo realizadas no Morro Dois Irmãos, mas a área da Jaqueira não está totalmente segura. O receio atual é que os destroços das casas demolidas sejam levados durante uma chuva forte e atinjam outras casas.
Atentos a esses problemas acarretados pelas mudanças climáticas, moradores de diversas favelas cariocas têm discutido, desenvolvido e compartilhado dados e estratégias de resistência. Exemplo dessas iniciativas é a análise publicada pela Redes da Maré em parceria com a empresa global WayCarbon a respeito das consequências do clima para o conjunto de 16 favelas que compõem o Complexo da Maré, em novembro de 2023. A Rede de Favelas Sustentáveis (que organizou cinco rodas de conversas, uma exposição e participou de um encontro no IPPUR sobre Memória climática, no ano anterior) listou ações desenvolvidas pela população favelada, como: criação de áreas verdes, mutirões de limpeza de rios e valões e implementação de telhados verdes.
A prefeitura do Rio de Janeiro lançou há dois meses o Plano Verão 2023-2024, em vigor até abril, com investimentos de 2,1 bilhões para reduzir os impactos das chuvas. Entre as medidas levantadas está a contenção de deslizamentos.
Esperamos que parte desse valor seja usado, ao menos, para a retirada dos entulhos do que um dia foram moradias na Jaqueira.
A resiliência climática deve contar com planejamento e execução de um plano governamental estratégico para as favelas, a partir de diálogos com a população favelada. Isso porque é esse território o mais atingido pelas conhecidas chuvas do verão carioca.