Comunidades no Rio sofrem com falta de acesso à internet durante pandemia do coronavírus

A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, visita o Teleférico do Alemão, zona norte do Rio. (Tomaz Silva/Agência Brasil)

O estado de calamidade pública por causa da pandemia do novo coronavírus segue causando impactos enormes na rotina da população brasileira. Com diversos setores da economia parados e a determinação de isolamento social, o Governo Federal aprovou o auxílio emergencial de R$600 até R$1200 para os trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados durante o período de crise.

Apesar do pagamento já ter começado, muitas pessoas ainda relatam dificuldade com o cadastramento e acompanhamento. O motivo principal é que as solicitações, devido ao isolamento social, foram feitas todas online, o que acabou dificultando quem não tem conhecimento tecnológico ou não tem computador. Este déficit tecnológico é algo muito presente nas classes D e E, das quais 85% das pessoas só têm acesso à internet via telefone.

De acordo com o governo, foram 36,3 milhões de pessoas cadastradas no site e aplicativo do auxílio emergencial – até às 17h de quarta-feira (15). E foi a partir deste fluxo de acessos que os primeiros problemas operacionais apareceram: sistema caindo diversas vezes, plataforma fora do ar, pessoas tentando realizar o cadastro por horas e falta de suporte para as inúmeras dúvidas.

Para Renata Silva, moradora da Cidade de Deus, o medo de não conseguir foi grande: “eu não sabia como fazer. Tentei cinco vezes e não saía do mesmo lugar. Pensei em desistir, a minha internet já não estava muito boa. Por sorte o meu vizinho me ajudou. No fim do dia ele me mandou uma mensagem falando que tinha conseguido e foi um alívio. Não sei como iria me virar sem esse dinheiro”, disse Renata, que trabalha como empregada doméstica.

Estudar se torna um desafio

Seguindo as determinações federais, todos os governos dos estados suspenderam as atividades escolares e acadêmicas, públicas e particulares, por tempo indeterminado. Tal medida resultou em praticamente integralidade de ensino à distância durante este semestre, o que tem levantado discussões. Para Neila Marinho, professora de uma escola particular, apesar dos alunos viverem a Era Digital, é necessário que eles saibam o funcionamento do programa usado para as aulas. No colégio em que ela dá aula, a grade de horários segue a mesma e a frequência é cobrada. Houve a adaptação de algumas funcionalidades do aplicativo e a disponibilização de um especialista para tirar dúvidas.

“O desafio é grande tanto com a nova modalidade de ensino, quanto em manter a atenção dos alunos em casa. Não se nega que o processo não é o mesmo, mas o conteúdo é passado da mesma forma. É lógico que estamos nos reinventando diante do problema da pandemia, e que estamos empenhadas em fazer o melhor pela educação, mesmo sabendo das dificuldades que podemos encontrar, assim como a falta de internet, o acompanhamento dos pais, porque alguns ainda estão trabalhando, avós que auxiliaram as crianças e dominam pouco o assunto, entre outros fatores”, diz Neila, que dá aula para alunos do 2º ano do Ensino Fundamental.

A realidade se torna ainda mais difícil dentro das escolas públicas do Rio de Janeiro. Apesar da Secretaria de Educação ter disponibilizado um curso online para os educadores, os docentes ainda relatam muitas dúvidas. Para Deise Mendes, professora de Língua Portuguesa para o Ensino Médio em três escolas públicas, dar aulas no formato EAD é uma novidade e um desafio. Segundo ela, muitos alunos procuram e mostram inúmeras dificuldades: “tem a falta de acesso à internet, a falta de habilidade com a plataforma e também o fato de não possuírem dispositivos que permitam baixar o aplicativo. O conteúdo que estava programado não pode ser dado integralmente, pelo menos por enquanto. Muitos alunos que não têm acesso à plataforma seriam prejudicados. Temos trabalhado com revisões, fixando os conteúdos já transmitidos em sala de aula. O nível de frequência dos  alunos é variável. Em algumas escolas temos uma boa participação, em outras não. Acredito que isso esteja ligado ao meio socioeconômico. Escolas situadas em comunidades carentes têm a adesão menor”, enfatizou Deise.

No ensino superior privado, a realidade não é tão distante e muitas reclamações surgiram não só pela falta de adaptação, mas também pela cobrança do mesmo valor de mensalidade do ensino presencial. No Rio de Janeiro, há o projeto de lei 2052/2020 dos deputados André Ceciliano (PT), Dr. Serginho (PSL) e Rodrigo Bacellar (SDD) que determina a redução de ao menos 30% da mensalidade durante o período de isolamento social.

Para Thamires Sartori, estudante de Jornalismo de universidade privada, a modalidade EAD é mais complicada, principalmente quando não há planejamento ou transição. Segundo a jovem de 21 anos, a faculdade em que estuda sequer deu orientação para as pessoas que não possuem internet em casa: “(a universidade) ignorou que pessoas que se matriculam para estudar presencial não vão ter essa facilidade rápida de aprender os conteúdos. Eu acredito que não tenha ocorrido nem uma reunião com os docentes para que as aulas pudessem ser feitas de forma positiva para todos. Estão fazendo lives, cada professor em um portal diferente. Isso mostra total despreparo”, relatou a estudante.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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