Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades
“Só Deus sabe como está a minha cabeça, a situação que eu estou passando agora com isso tudo. Tô cansado…”, expõe o pedreiro e eletricista Alessandro Oliveira da Silva, de 41 anos, morador da Nova Brasília, que na quinta-feira (22) teve o carro arrastado por um blindado durante operação da Polícia Militar (PM) realizada no Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio de Janeiro.
Na imagem compartilhada nas redes sociais por moradores indignados, é possível ver o Monza Tubarão, fabricado há 30 anos, preso entre outros dois carros que também foram prejudicados com a passagem do blindado. De acordo com vizinhos de Alessandro, o caveirão passava pela Praça do Terço, Nova Brasília, quando engatou no carro. Para soltar, bateu diversas vezes no veículo do morador até desprender. “Meus vizinhos falaram que sacudiram meu carro como se fosse uma sucata qualquer”, conta Alessandro.
Na manhã em que o autônomo tomou o prejuízo, blindados circulavam nas ruas da comunidade e 2 helicópteros sobrevoavam o Complexo desde às 5h50. A data marcava o segundo dia de volta às aulas, anunciado no dia 19 de abril pela Secretaria Municipal de Estado.
O autônomo conta que estava na rua no momento do acontecimento e, por pensar que o tiroteio fosse no Loteamento e Fazendinha, e não na Nova Brasília, desceu a comunidade, a fim de comprar pão para a família e tomar café antes de ir trabalhar. “Fiquei na padaria até umas 10h, porque não tinha como retornar para casa. Eu queria tirar o carro dali. Via as fotos que meus amigos estavam mandando. Todo mundo que mora aqui sabe que minha vida é trabalho. Todo mundo sabe que minha vida é sofrida. Eu não ostento nada, tanto que você vê que é um carro velho. Parece que fui sorteado para ser prejudicado. Quando me relataram a situação, eu fiquei muito chateado. Se eu tivesse ali embaixo e visse, eu acho que ia subir no caveirão. Não ia conseguir só assistir!”
O carro foi comprado em março e está sendo pago em prestações. Alessandro, que é muito religioso, conta que ainda deve R$ 1.500 para quitar o automóvel. Mas, com as condições atuais do veículo, não está fácil juntar dinheiro. “Não estou conseguindo trabalhar porque o carro não dá para me levar pra lugar nenhum. Não tenho cabeça direito mais. Tenho que consertar o carro se eu quiser continuar trabalhando. Tô com meu psicológico que só Deus sabe. E aqueles que falam besteira, eu tô é pouco me importando com eles, porque não sabem o que a gente, que mora em comunidade, vive”, disse sobre os comentários maldosos que tem lido nas redes sociais.
“O carro não fica no meio da rua, estava onde vários outros costumam ficar estacionados. Eu não tenho condições de pagar uma garagem. Tu acha que se eu tivesse condições eu não pagaria? Se eu tivesse um bom emprego, de carteira assinada, que pagasse um bom salário, com certeza eu botaria numa garagem, que também é caro. Mas eu não tenho nada disso não. Nem o carro eu tô com condição de pagar direito.
“Agora eu tô com dois problemas: um é terminar de pagar uma coisa que não me serve pra mais nada, e o outro é consertar. Então quer dizer. Eu queria que as pessoas olhassem, imaginassem o Estado, que é responsável por isso que eles fizeram. Olhasse como é que um trabalhador é tratado. Porque, eu te mostro. Meu carro está cheio de ferramentas ainda; meu carro é um carro de trabalho”.
Veículo era usado para o lazer de crianças da Nova Brasília
Alessandro conta que todo domingo, entre um bico e outro, tira um tempo para descansar e sair com seus filhos. Durante a semana, outras crianças procuram por ele para ir junto nos passeios. Conta que “catava as crianças que estavam à toa na rua” e, após conversar com as famílias, pegava toda a turma para passear no Monza 1991.
“Pego as crianças daqui da comunidade que quer ir para um festival de pipa, que quer ir para um futebol. Trabalhei no projeto Segundo Tempo há muitos anos. Amo pegar a molecada e levar para o campo e mostrar para eles que a vida não é droga e nem o que eles enxergam por aí. Nós que somos da antiga sabemos o que é viver e procuro mostrar isso para eles também. De repente eles interrompem uma coisa que a gente acha que vai dar mais certo… Não sei nem o que pensar”.
Defensoria Pública
A ouvidoria da defensoria pública informou que está totalmente a disposição para prestar atendimento jurídico para todas as vítimas e denúncias relacionadas a dano ao patrimônio. Para o Voz das Comunidades, o ouvidor Guilherme Pimentel informou que Alessandro será atendido por um profissional do núcleo especializado.
Vakinha online
Alessandro conta que ainda não procurou um mecânico para fazer o orçamento, pois não faz a menor ideia de quando terá condições de arrumar o prejuízo. Por conta disso, iniciou uma vakinha online com o objetivo de atingir a meta de R$ 3.500 para a reforma do veículo. Você pode clicar aqui para ajudar.
O governo do Estado do Rio informou que aguarda a decisão da Justiça para tomar as medidas cabíveis.