No dia 24 de março, o Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro publicou medidas para reduzir a letalidade policial em operações nas comunidades. Atendendo à determinação do Superior Tribunal Federal (STF), o plano de diminuição aborda práticas abordando pontos como a instalação de câmeras nos coletes dos agentes, requalificação da guarnição e acompanhamento psicológico dos policiais.
Ainda que o plano tenha sido apresentado, muitas das medidas publicadas não atendem integralmente à comunidade. Muitas questões são apontadas pela jornalista, especializada em segurança pública e idealizadora da plataforma Fogo Cruzado, Cecília Olliveira. “Tem muitas questões do plano de letalidade que o fazem não ser considerado um plano efetivo. Tanto que organizações da sociedade civil, junto com a Defensoria Pública, foram até o Supremo Tribunal Federal para pedir a não homologação das medidas apresentadas”.
O pedido para que o STF desconsidere o plano apresentado pelo Estado do Rio de Janeiro argumenta que as propostas não apresentam pontos, como recursos financeiros ou um cronograma de execução. Na visão de Cecília Olliveira, um detalhe pertinente que demonstra a falta de comprometimento do governo do Rio de Janeiro, para com a determinação do STF, é a configuração de um conselho fiscalizador do plano que não conta com a presença do Ministério Público. “Esse conselho é composto apenas por representantes que têm relação direta com o governo. Não há lugar para o Ministério Público, que tem como uma das suas funções específicas o controle externo da atividade policial”. O pedido da não homologação do plano apresentado foi acatado pelo ministro do supremo, Edson Fachin, que ordenou que o governo do Rio de Janeiro se manifeste a respeito.
O plano de redução da letalidade não parte somente da determinação do Supremo Tribunal Federal, mas também da pena que o Estado recebeu da Corte Interamericana de Direitos Humanos diante do caso chamado “Chacina de Nova Brasília”, ocorrido entre 1994 e 1995, quando foram registrados 26 homicídios. Cecilia argumenta que o governo do Rio de Janeiro se mostrou negligente em não apresentar um plano de redução desde o episódio ocorrido na comunidade. A condenação saiu em 16 de fevereiro de 2017. “Ou seja, décadas depois. Enquanto tudo isso era julgado, os policiais continuavam na ativa. Só depois dessa condenação que o assunto voltou à tona”.
Um dos pontos que chamam a atenção no plano de redução da letalidade é a instalação de câmeras nos coletes dos agentes e em viaturas. Cecília argumenta que a instalação de câmeras nas guarnições de São Paulo reduziu os homicídios cometidos pela polícia em 80%. “Esse é um dado direto. Mas vale mencionar que essa determinação já estava tramitando no Rio de Janeiro e isso já era uma discussão”. Cecília lembra do caso dos Morro do Sumaré, no qual câmera instalada na viatura serviu como prova incriminatória contra os PMs. “Depois disso, as câmeras meio que sumiram. Mas, agora com plano determinado pelo Supremo, isso volta à tona. O STF pediu a instalação de câmeras em todas as viaturas, enquanto o plano do governo do estado propõe a instalação de câmeras em veículos blindados. Ou seja, o Estado vai na contramão do que foi determinado pelo STF, a mais alta instância do poder judiciário brasileiro.
Nesse jogo de plano de redução de letalidade em operações, o lado que mais sofre ainda é a população das comunidades, que não foi consultada sobre as medidas apresentadas e ainda convive com frequentes operações policiais. Sobre qual seria um plano de redução ideal, Cecília detalha que a corrupção policial dentro das instituições e a falha do Ministério Público em cumprir com a missão de fiscalizar atividades da PM são pontos cruciais que devem passar por manutenção. “Sem essas duas situações em específico, não tem nem por onde começar. Mas ainda teríamos que falar sobre a estrutura da sociedade brasileira em relação à igualdade, abordando classe social, gênero, ou seja, como um todo”.