No Dia Mundial da Juventude, três jovens contam como atuam para mudar a realidade das favelas

Rennan Leta, Lua Oliveira e Preta são referências no trabalho social que desempenham na área de cultura, educação e saúde mental
Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

Malala, Rene Silva, Greata Thunberg. Esses são os nomes de jovens conhecidos internacionalmente por seus trabalhos ligados à educação, ao meio ambiente, direitos humanos e acesso à informação. No entanto, outros inúmeros jovens pelo mundo também se preocupam com a melhoria da sociedade. Seja em igrejas, ONGs ou em ações individuais, é certo a presença deles, engajados em um objetivo em comum: o bem-estar social. Neste 30 de março, o Dia Mundial da Juventude, criado pelo Papa João Paulo II, em 1985, visa lembrar e homenagear todo o potencial dos mais novos. 

Rennan Leta, Lua Oliveira e Diene Carvalho, mais conhecida como Preta, fazem parte desse grupo. Eles não se acomodaram com as situações que presenciaram e arregaçaram as mangas. Dedicam-se de corpo e alma aos ideais que acreditam e usam uma das características mais marcantes da juventude atual: a vontade de agir! Mas, antes do papo reto, quem são eles?

Rennan Leta

Rennan Leta tem 26 anos. É comunicólogo, escritor, poeta, casado e pai. É autor do livro “Palavras do Mundo” e fundou o projeto ‘Favela em Desenvolvimento’, que atende 11 comunidades do Alto da Boa Vista. A iniciativa existe desde 2017, mas evoluiu e se transformou em um centro comunitário em junho de 2021. 

Hoje, o local oferece aulas de reforço do ensino fundamental I, aulas de cinema e audiovisual e conta com laboratório de informática. Mas não para por aí! Oficinas de de percussão, moda e ações beneficentes são outras atividades do centro social focadas no desenvolvimento da juventude. 

Rennan foi homenageado na Câmara Municipal dos Vereadores, em 2021, devido ao trabalho que exerce com a juventude no Favela em Desenvolvimento.  

Rennan Leta também já fez parte do Voz das Comunidades
Foto: Vilma Ribeiro / Voz das Comunidades

Lua Oliveira

Raissa Luara de Oliveira tem apenas 14 anos e uma vida cheia de sonhos. Em 2019, com apenas 13 anos, fundou uma biblioteca comunitária batizada de “Mundo da Lua” no Morro Tabajaras e Cabritos, na Zona Sul do Rio. A ideia de fazer o “No Mundo da Lua” surgiu em uma visita da adolescente à Bienal do Livro, onde percebeu que crianças de escolas públicas não levavam os livros para casa. Com isso, voltou à comunidade e montou um espaço. 

Atualmente, Lua ajudou a montar 52 salas de leituras em outras comunidades do Estado. Pará, Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo também receberam os espaços de leitura idealizados pela jovem. E, a paixão dela pela literatura a fez receber, no início do mês de março, o título de acadêmica titular na Academia de Arte, Ciências e Letras do Brasil. Ainda neste mês, ganhou o prêmio Ubuntu de Cultura Negra e foi indicada ao reconhecimento ‘Jovem embaixadora da Paz’. A premiação é organizada pela Youth and Students for Peace e acontecerá entre abril e maio de 2022.

Lua Oliveira com título impresso de acadêmica titular na Academia de Arte, Ciências e Letras do Brasil.
Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades

Preta

O nome dela é Diene Carvalho, mas, se você a chamar pelo nome, ela prontamente vai dizer: me chame de Preta! A jovem é fundadora e coordenadora do Projeto Maktub Experience, que oferece consultas online com psicólogos de forma gratuita ou a preços populares.

O Maktub surgiu em 2018, após a jovem tentar quatro vezes tirar sua própria vida. Transformou a sua experiência e hoje visa acolher pessoas que estão com doenças mentais, como depressão, ansiedade e crises de pânico. Pensando no difícil acesso a quem precisa cuidar da saúde mental, Preta e sua rede de apoio oferecem também rodas de conversa, ações sociais e culturais em comunidades do Rio. 

Preta, na sede do projeto Maktub, em Guadalupe.
Foto: Jacqueline Cardiano / Voz das Comunidades

Agora, o papo reto

1- Qual a importância do seu trabalho nas favelas? 

Rennan Leta – A importância é ter um local de formação, onde as crianças, jovens e comunidade como um todo tenham acesso à internet, que a gente tem lá na Casa Favela. Acesso liberado à internet, seja via Wi-fi, ou via computadores que temos para uso. Ter acesso a mais direitos, por exemplo. A gente tem atendimento jurídico gratuito. Ter acesso a novas opções de formação, como cinema, teatro. Fazemos um movimento sociocultural que vai além do comum. Acho que a importância é isso. Trazer novos olhares e novas perspectivas pros moradores.

Lua Oliveira –  A minha biblioteca é importante aqui na minha comunidade porque as crianças, adolescentes e adultos têm acesso aos livros. A biblioteca fica aberta de segunda a sexta-feira e, quando tem algum evento, aos sábados. Ela traz acesso a todos que queiram ler. Eees estão sempre aqui e podem pegar emprestado, podem ler na biblioteca ou podem fazer troca de livro.

Preta – Hoje a maior importância do meu trabalho nas comunidades é levar acesso a quem não pode pagar. Ou que não acreditam que uma terapia, que ajuda um profissional, pode fazer muita diferença! Então é saber que o Maktub não é só um projeto que presta um serviço. Ele é um projeto que funciona. Ele de fato funciona dentro desses territórios. A grande importância que ele tem é levar acesso, levar acolhimento, levar cultura, levar arte. 

Acredita que a juventude ainda tem força para mudar a sociedade de forma positiva?

Rennan –  Eu acredito que a juventude tem que ser olhada não só como o nosso futuro, mas também como nosso presente. Uma prova disso é que, em 2020, quando veio a pandemia, eu diria que 80% das ações de combate à fome, de combate à pandemia, vieram de projetos liderados pela juventude. A juventude, sobretudo a juventude periférica e favelada se colocou na linha de frente, em diversas áreas, em diversas comunidades e territórios. Isso mostra que a gente não é só o futuro, já é o presente também. A partir disso, eu acredito que a gente precisa ter mais jovens ocupando lugares de poder, ocupando lugares de tomada de decisão, sem entrar naquela mesmice. Ah, é muito novo, ah, não tá preparado. A gente só vai saber se tá preparado ou não quando colocar, né. Acho que a nossa juventude é a mudança que o país precisa. 

Lua Oliveira – Acredito nos jovens Esta juventude tem uma força, só precisa de incentivo e investimento. Eu espero que eles tenham um lugar de fala com políticas voltadas para os jovens. 

Preta – A partir da transformação, eu espero grandes potências, grandes falas de empoderamento, de que, sim, a favela e a juventude vence. A galera que mora na favela não pode ser julgada, eles não podem ser inferiorizados por morar em territórios de favelas. Lá existem pessoas muito potentes, pessoas que têm um potencial muito grande e que fazem a diferença. Então o que eu penso, para os próximos anos, e para a juventude, é que essa potência seja ainda maior!

Você acha que o Brasil tem “jeito”? Se pudesse realizar um desejo imediatamente, qual seria?

Rennan – Eu acho que o Brasil tem jeito, até por que se eu não achasse isso, eu não faria o trabalho que eu faço. Se eu pudesse realizar um desejo imediato, seria parar, acabar com essa violência que só prejudica quem tá dentro da favela. Eu acho que a partir do momento que eles pararem de nos matar, a gente vai conseguir caminhar melhor. Não dá pra esperar que um jovem de favela salve o Brasil, se esse jovem não chegar aos 20 anos. 

Lua Oliveira – O Brasil tem jeito! Mas primeiro tem que ter políticas públicas voltadas para periferias. As comunidades carecem de educação, saúde, cultura e lazer. As pessoas das comunidades são sensatas. O povo, em sua grande maioria negros, é sem direito a nada e com um salário de miséria. Vamos investir em qualidade de vida! Eu gostaria que todo jovem, criança, tenha os mesmos direitos básicos que nos garante a Constituição…  saúde, educação, lazer, cultura, moradia e alimentação. Que todo jovem tenha direito a uma faculdade pública e ter direito à vida. Vida com dignidade!

Preta – Eu acho sim que o Brasil tem jeito, mas acho que a gente só vai mudar isso de fato colocando pessoas que olhem pro Brasil como uma potência. Alguém que administre de uma maneira humana. E, se eu pudesse realizar um desejo agora, eu acho que realizaria em ter um país igual, pra todas as pessoas.  Igualdade em todas as formas. 

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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