Duas presenças são mais que certas nas rotinas das comunidades cariocas: a de descaso e a de vulnerabilidade social. É de senso comum que alguns serviços públicos, que são classificados como Direitos Humanos, não alcançam grande parcela das favelas do Rio de Janeiro, como a de entrega de correspondências nas residências. Entre os motivos que elevam essa condição nessas localidades estão o preconceito de CEP (Código de Endereçamento Postal) e a falta de conhecimento do território favelado.
Encarando essa realidade como desafio de transformação social, quatro amigos do Vidigal criaram, em 2005, o Correio Comunitário, iniciativa que organiza e realiza a entrega de correspondências, pacotes e compras em 80% das residências da favela da zona Sul do Rio. Na construção coletiva de uma vida digna para os moradores, Carlinhos, Wilson, Rômulo, Marcelo e Edson atuam, de segunda a sexta, das 9h às 17h, na distribuição do correio.
“Em um certo dia, sentamos em uma mesa de bar para debatermos os problemas sociais que nossa favela enfrenta. Nessa conversa, chegamos à conclusão que era muito ruim o antigo sistema de entrega – se é que dá para chamar assim – do correio no Vidigal e percebemos que era possível criar um Correio Comunitário, onde os próprios moradores da comunidade realizassem a entrega”, detalha Marcelo.
De acordo com Marcelo, um dos agentes comunitários da iniciativa, antes da criação do Correio Comunitário, as entregas dos Correios (empresa pública do governo federal) eram em estabelecimentos comerciais, como bares e biroscas. Os moradores tinham que buscar as próprias encomendas e correspondências nesses lugares. Tal situação, que não acontece em bairros considerados “nobres”, aumenta o número de extravios nos pacotes. Além disso, em algumas situações, a população local tinha que se locomover até a agência de Ipanema para retirar os pedidos.
“Antes era muito raro a entrega nas residências dos moradores. O governo federal entregava nos bares nas comunidades e as pessoas iam nesses estabelecimentos pegar, mas essa situação gerava muito desconforto e extravio”, comenta.
Agora, com mais de 15 anos de atuação, o próprio Correios descarrega a carga de pacotes e encomendas diretamente na sede da iniciativa, que fica na Associação dos Moradores do Vidigal. “Hoje, conquistamos a confiança do governo federal que deixa todas as entregas aqui. Com isso, realizamos a distribuição na comunidade ou avisamos que chegou aqui”, destaca Edson.
A iniciativa, que surgiu de forma gratuita, cobra uma taxa simbólica de 15 reais por família para continuar os serviços na comunidade. Atualmente, o Correio Comunitário possui um cadastro de 300 residências e, segundo Marcelo, o número alcança mais de mil pessoas no Vidigal. “A gente sabe que, geralmente, em uma casa de favela, há inúmeras pessoas vivendo ali. Então, cobramos um valor simbólico para fazer a entrega para todos da residência”, explica.
Visando o futuro e a melhora no cotidiano da favela, a iniciativa busca alcançar o nível de agência de entregas no Vidigal. Pois, assim, facilitaria toda a estrutura de encomendas na comunidade.