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UPP em 10 anos: fracasso ou progresso?

Pesquisa publicada em 2016 já revelava total insatisfação dos moradores sobre Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)

Colaboração: Melissa Cannabrava e Beatriz Diniz
Foto: Renato Moura / Voz das Comunidades

Em 2020 completam 10 anos da “pacificação” do Complexo do Alemão, sendo um grade marco no governo do então ex-governador Sérgio Cabral, preso desde novembro de 2016, sentenciado a mais de 280 anos de prisão, seguindo em regime fechado. A Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) é um projeto da Secretaria Estadual de Segurança do Rio de Janeiro e teria o objetivo de introduzir a polícia militar no cotidiano dos moradores de favelas. Mas será que a “pacificação” só se faz com segurança? A sensação de segurança e ter apenas a polícia presente é o que moradores realmente precisam? A UPP seria um fracasso ou progresso?

O projeto da UPP foi criado no fim de 2008. A primeira unidade foi instalada na Favela Santa Marta, em Botafogo, zona Sul do Rio, em 19 de dezembro de 2008. A experiência no Morro Santa Marta tornou-se referência para a atuação das unidades e indicava os caminhos para uma política pública de segurança bem sucedida. Dez anos depois, o número de UPPs passou de 38 para 29.

Mapas das UPPs em 2008

UPP – Social

Dentro do projeto da UPP havia a proposta de UPP Social, coordenada pelo Instituto Pereira Passos (IPP) em parceria com a ONU Habitat, que promoveria o avanço urbano, social e econômico das favelas com Unidades de Polícia Pacificadora. Lins de Vasconcelos e Camarista Méier foram as primeiras comunidades que receberam UPP Social. Originalmente, o projeto era do governo do estado até 2010 e foi transferido para a prefeitura da capital em 2011.

O objetivo da UPP Social seria colher informações sobre as necessidades das favelas ocupadas por Unidades de Polícia Pacificadora e articular melhorias nos serviços públicos ausentes ou de baixa qualidade. Assim, a presença do governo estadual e da prefeitura iria além da segurança nestas áreas e incluiria saneamento (sistema de esgoto), coleta de lixo, educação e saúde, entre outros serviços públicos.

Em 2015, o site RioOnWatch publicou uma reflexão sobre a UPP Social no artigo A Morte da UPP Social: Fracasso da Participação, demonstrando haver poucas evidências de que a demanda por serviços públicos nas favelas foi cumprida. Também foi apontado que a UPP Social foi subordinada fundamentalmente à política da UPP: onde não houve “pacificação” e não houve “social”.

No Complexo do Alemão

Durante esses dez anos de “pacificação” pode-se destacar apenas uma ação em que a UPP se fez presente na vida dos moradores e que por falta de verbas não teve continuidade. Em uma das localidades na favela do Alemão existia um grupo de policiais que fazia atividades com crianças e idosos, eram os chamados policiais P1*. A iniciativa era muito dos policias, tinha pouco do investimento do Estado e sem investimento acabou.

*O nome vem da divisão administrativa da PM, que prevê cinco áreas de atuação: P1 ‐ recursos humanos; P2 ‐ inteligência; P3 ‐ estatísticas; P4 – armamentos; P5 ‐ relações públicas.

O que deu errado no plano para “pacificar” o Rio?

A Julita Lembruger, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) da Universidade Cândido Mendes já falava em 2016 no fracasso do projeto da UPP. Durante entrevista para a revista Exame, ela afirmou que “no início, o projeto até foi bem cuidado; houve uma preocupação no treinamento dos policiais e no diálogo com as comunidades”.

De acordo com o estudo “Os donos do morro”, organizado por Ignacio Cano, Doriam Borges e Eduardo Ribeiro, publicado em 2012 no Fórum Brasileiro de Segurança Pública, LAV/UERJ, o número de mortes violentas nas áreas pacificadas caiu quase 75% entre janeiro de 2006 e junho de 2011.

No levantamento feito em 2016, durante o curso de Jornalismo de Dados da Faculdade Hélio Alonso (Facha), publicado no site Medium, é possível ter acesso à informações que mostram a total insatisfação de moradores em relação à UPP. O levantamento revela que, na época, 65% dos moradores de favelas do Rio tinham medo de sofrer violência policial dentro de seus territórios. Em comparação com todos os estados brasileiros, 59% dos moradores de favelas temiam a violência por parte da polícia. Quando perguntados como as UPPs contribuíram para a melhoria da segurança da cidade, 44% declararam que elas não melhoraram, 42% que melhoraram um pouco, 7% que melhoraram muito, 4% não souberam responder e 2% se recusaram a responder.

* Nesse levantamento realizado entre os dias 12 e 13 de agosto de 2014, o Datafolha entrevistou 1.317 eleitores em 31 municípios do estado do Rio de Janeiro. A margem de erro máxima é de 3 pontos percentuais, para mais ou menos.

Relembre 10 polêmicas envolvendo a UPP nas favelas

Nesse mapa você consegue visualizar cada Unidade de Policia Pacificadora e a data de implantação nas favelas do Rio:

Em 2018, o então comandante-geral da Polícia Militar (PM) do Rio de Janeiro, coronel Wolney Dias, estudava reduzir de 38 para 20 o número de Unidades de Polícia Pacificadora mas não informou quais seriam fechadas. Em 2019, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou, em primeira discussão, um projeto de lei que prevê o fim das UPPs em todo estado.

Em 2020, o então governador Wilson Witzel (atualmente afastado do governo estadual), com o seu novo secretário de segurança, coronel Rogério Figueredo de Lacerda, tinha como intenção retomar o projeto das Unidades de Polícia Pacificadora, trazendo não só mudanças no policiamento mas também implantando ações sociais nos territórios. Além da Rocinha, primeira a ser reestruturada de acordo com o cronograma da PM, Santa Marta, em Botafogo, e Chapéu Mangueira e Babilônia, no Leme, também estavam na lista, porém, a retomada não chegou a ser implementada.

Em 28 de agosto de 2020, Claudio Castro, atual governador em exercício, anunciou um novo plano para segurança publica do Estado. Segundo ele, seria necessária uma “ocupação” com serviços públicos em áreas consideradas de risco. Desde então, nada foi realizado de fato.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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