Até hoje, nenhum incentivo a cultura e educação foi implantado para reduzir a violência
Depois de oito anos da Ocupação do Alemão, que começou durante as primeiras horas da manhã de um domingo, dia 28 de novembro de 2010, a situação de exceção imposta aos moradores segue firme. Na época, mais de 2.700 homens das polícias Civil e Militar, juntamente com o Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), Força Nacional, Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) e Forças Armadas participaram da operação que, de acordo com a Secretaria de Segurança, resultou na prisão de 20 pessoas.
A ocupação teve seu início após uma onda de ataques a ônibus que tomou conta da cidade, em 23 de novembro, quando veículos foram incendiados simultaneamente em vias de grande circulação, como a Linha Amarela, Avenida Brasil e outras próximas aos Complexos do Alemão e Penha, resultando em uma ordem vinda do Governador Sérgio Cabral, para que policiais invadissem as comunidades. Com isso, o clima de tensão tomou conta das favelas e moradores acompanhavam as notícias, que desde o início da semana, contavam sobre uma suposta invasão dos militares, que ameaçavam entrar nos Complexos a qualquer momento.
“Foi um momento muito tenso, nós não sabíamos de que forma viriam e como seria esta invasão. Na véspera, não consegui dormir e só pensava em proteger meus filhos que ainda eram muito pequenos. No dia do acontecimento não suportei a pressão e fui para a casa da minha irmã. Voltei dias depois. Foi triste demais!” – comenta uma moradora ao relembrar o caso.
No sábado, 27 de novembro, as tropas militares encetaram suas estratégias e fizeram um cerco com seus tanques de guerra, impedindo o trânsito e a entrada e saída de moradores, trabalhadores e estudantes. Quem já havia conseguido sair, não pode retornar para sua residência, enquanto outras, procuravam o cômodo da casa mais seguro para se abrigar. Além do Alemão e Penha, outras comunidades também passavam por operações no mesmo dia, multiplicando a tensão dos moradores de áreas periféricas do Rio de Janeiro.
No dia seguinte, enquanto centenas de militares marchavam em direção aos pontos mais altos, com suas melhores fardas e armas engatilhadas, dezenas de homens fugiam pela mata da Serra da Misericórdia, caminho que faz ponte entre os Complexos. Era próximo ao meio dia de domingo quando um caveirão aéreo iniciou os disparos em direção daqueles que corriam no estilo ’’salvem-se quem puder”. Toda a cena foi transmitida ao vivo pela TV Globo, também de um helicóptero, enquanto jornalistas ocupavam a parte baixa da favela e brigavam pela melhor imagem, que logo se multiplicava para todo o mundo.
- Arrombamentos, saques de comércio e torturas físicas e psicológicas marcaram a data, sendo recorde com diversas denúncias de abusos dos agentes do Estado, que não poupavam esforços para encontrar drogas e armas na região. “Eles arrombaram a minha casa, quebraram as coisas, comeram, beberam e ainda roubaram minha caixa de ferramentas. A vizinha estava até com a chave da minha casa, pois já imaginávamos que podia acontecer, mas eles não deixaram ela abrir. Eles mesmos arrombaram e passaram o dia todo lá dentro”. – relata um senhor que vive no Alemão.
A ação teve um investimento significativo, somando no total mais de R$150 milhões aos cofres públicos. De acordo com o Comando Militar do leste (CML), a maior parte da verba foi destinada para compras de equipamentos que foram usadas durante a ocupação. A informação foi dada pelo então general da reserva Adriano Pereira Júnior, que atuou como comandante das tropas de pacificação, sem dar muitos detalhes.
“Eu não fico com o trabalho financeiro. Faço o pedido: preciso de tantos fuzis e tantos veículos, e recebo esse material… Se isso é um gasto excessivo, eu pergunto: quanto vale uma vida? Quantas vidas foram poupadas aqui? Quanto vale também a paz dos pais ao saberem que vão sair para os seus trabalhos e que os filhos vão para a escola no horário normal, ter aula e sair ao final dela? Isso não tem preço.” – Questionou o comandante durante entrevista um ano após a ocupação.
No segundo semestre de 2012, era inaugurada as duas últimas UPPs no Complexo do Alemão, totalizando oito unidades espalhadas pela favela. Com a criação das novas unidades, o Exército, que até então mantinha seus soldados, a maioria bem jovem, no local exercendo seu autoritarismo, deu espaço para o BOPE, que seguiu revistando todo ser vivo que passava pelo local. Em 27 de dezembro de 2013 criaram a delegacia do Alemão, que em pouco menos de cinco anos foi extinta pela Intervenção e teve suas portas fechadas em agosto de 2018.
Oito anos depois de toda a história que chocou milhares de pessoas em todo o mundo, além de um projeto chamado Patrulha Escolar, nenhum incentivo a cultura e a educação foi implantado para reduzir a violência e a criminalidade nos Complexos do Alemão e Penha. “Os menó da época hoje já tá tudo de fuzil. A bala não para, a bala não para! Daqui 10 anos quero vê o que mudou outra vez. Ainda dá tempo de salvar as crianças de hoje! A parada é dá conhecimento pra menozada. Ainda há tempo!”