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‘Dá licença que tamo chegando’: Grupo pioneiro, Fundo de Quintal vai levar o samba tradicional para o Rock in Rio 

Grupo foi fundado por Bira Presidente, Ubirany e Sereno no final dos anos 70. Eles se apresentarão dia 19 de setembro
Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades

Se o samba tivesse uma escola, seria o Fundo de Quintal. Foi em 1976, em meio a ditadura militar, que o grupo nasceu. Pode ser contraditório colocar revolução e tradição como aliados, mas é o que eles representam – sim, revolucionaram o samba, que segue tradicional até hoje. “A gente faz o arroz com feijão, que sempre deu certo”, diz Jalcireno, um dos fundadores. Quer dizer, o Sereno. Fundou também o Cacique de Ramos. Fazendo história há quase 50 anos, o grupo tem mais de 2 milhões de ouvintes mensais no Spotify. E se eu te disser que, pela primeira vez, os gigantes do samba vão estar no Rock in Rio, dia 19 de setembro? Curadoria fina, viu? 

Bira Presidente, Sereno e Ubirany (1940-2020) foram os primeiros a compor o grupo mais premiado e reconhecido do Samba. Dois deles foram responsáveis pela criação de dois instrumentos musicais – Sereno criou o tantan e Ubirany o repique de mão. Já passaram pela tradicional banda nomes como Arlindo Cruz e Jorge Aragão. 

Hoje, os seis integrantes são: Ademir Batera, Junior Itaguay, Márcio Alexandre e Thiago Testa, além dos fundadores Bira e Sereno. Durante entrevista ao Voz das Comunidades, que aconteceu em uma pausa do ensaio, buscamos saber um pouco mais sobre os integrantes. Bira Presidente, que também é o Ubirajara Félix do Nascimento, de 87 anos, não estava presente no dia, porque o cara simplesmente chega no palco e faz seu show, no gogó. Criou, junto de Sereno, o Cacique de Ramos. Assim fica fácil dizer de onde ele é, né?! Para não restarem dúvidas: Ramos, Zona Norte do Rio de Janeiro.

Tantan. Do Sereno. Como já sabem, o Jalcireno Fontoura de Oliveira, de 84 anos, morador de Olaria, Zona Norte – chegou a dar o endereço completo, prova de que não deve nada! “Sou vizinho do Cacique de Ramos, onde tudo começou”, rememora. “Chegamos e abrimos a passagem do samba. Vocês nos dão licença que tamo chegando! Agora, o samba tá aí, com tudo, com todas as forças. O grupo Fundo de Quintal teve a felicidade de colocar dois instrumentos, que atravessaram as fronteiras. Até no Japão fizeram um grupo se inspirando no Fundo de Quintal.”

Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades

Ele segue contando, com paixão, que conseguiram manter a essência do grupo até os dias de hoje. Afinal, o Fundo de Quintal não morre nunca, é um fundamento. “O povo abraçou.” Ao pensar sobre a estreia no Rock in Rio, ele volta no tempo: “Eu aplaudi o Fred Mercury no primeiro Rock in Rio”. E continua, agora sobre o grupo: “A direção [do Rock in Rio] teve uma grande sacada, ela não foi boba, chamou o Fundo de Quintal que é a número 1. E é com grande satisfação que vamos encarar essa barra gostosa!”, diz, com seu sorriso largo. 

Banjo. No comando, Junior Itaguay, ou Silvio do Nascimento Júnior, de 50 anos. Nascido em São João de Meriti, Baixada Fluminense, sua família é cria das favelas do Centro – seus pais eram do Fallet-Fogueteiro, e seu avô da Providência. Há oito anos no Fundo de Quintal, ele compartilha: “A gente não chega no grupo sendo Fundo de Quintal, a gente aprende aos poucos a ser Fundo de Quintal. No jeito de tocar, na maneira de falar com o público, na nossa conduta no dia a dia; tudo isso conta”. 

É bonito de ouvir Junior Itaguay. Na verdade, a galera do samba é sempre poética. É tradicional, sem deixar de ser revolução. Sim! E ele traz o segredo: “O que contagia os mais novos é essa admiração por uma fórmula que não mudou”. Único que não tem a tatuagem do Fundo de Quintal no corpo, Itaguay finaliza: “Eu sou todo marcado, é que você não tá vendo. E onde tá marcado, só vai dar para ver quando abrir o peito”.

“a gente aprende aos poucos a ser Fundo de Quintal”, diz Itaguay
Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades

Cavaquinho. Márcio Alexandre Teixeira Moreira, de 42 anos, é cria do Morro da Congonha, Zona Norte do Rio, mas conta que já morou em vários morros: “quase um cabrito, morei em uma porção de morro”, brinca. “Tudo risco de vida”, fala em seguida, rindo. Márcio vê o Fundo de Quintal como um estilo de vida. “Nada tão popular quanto o samba. Hoje o samba não é mais regional, o Brasil todo canta samba. O Fundo de Quintal foi quem cavou o poço para a gente [nova geração] estar bebendo água dessa fonte”, afirma. Sereno concorda: “Justamente”. 

Márcio prossegue, relembrando que o samba era marginalizado, ritmo de preto. “Tudo que é preto é demonizado – e depois tudo fica maravilhoso, todo mundo é bom”. Ele reflete: “Na minha comunidade a gente não pensava que poderia dar uma vida digna para nossa família. Não tô dizendo que a gente é rico, mas a gente come do samba, bebe do samba, se veste do samba. Assim como acontece no movimento do Funk, por exemplo”.

Repique de mão. Instrumento inventado por Ubirany, Thiago de Souza Brandão, vulgo Testa, 39, agora é quem o comanda. Ele é do Complexo da Mangueirinha, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Para Testa, o Fundo de Quintal é tudo. Uma prova? Ele mesmo diz assim, ó: “Eu sou do maior grupo do universo, chamado Fundo de Quintal!” Testa fala sobre como este grupo tão importante para a História do País é reconhecido mundialmente. “Você vai em qualquer lugar do mundo; China, Estados Unidos, França, Japão… E todo mundo canta Fundo de Quintal!” Ele queria dar um spoiler, mas só deixou no ar. Resta não perder o espetáculo!

Bateria. Mas não é qualquer uma, é aquela tocada por Ademir Batera, ou Ademir da Silva Reis, ou então Bigode de Andorinha, como os integrantes o chamam – lá é igual capoeira, todo mundo tem um apelido interno. “Sou nascido e criado em Mesquita, Rua Marte”, mais um da Baixada! Fora os fundadores, Ademir é o que tem mais tempo de banda: são 40 anos tocando bateria no samba de uma maneira peculiar. E, diz, com muito sentimento: “Eu toco esse instrumento maravilhoso [aponta para a bateria]”. De poucas palavras, Márcio falou algo sobre o baterista que talvez a modéstia de grande músico o impeça: “Se hoje tem bateria no samba, deve ter sido por causa do Ademir Batera”. Mas, uma coisa Ademir confessou: “Todo show é a mesma coisa: um nervosismo!”, e todos concordaram. 

Foto: Selma Souza / Voz das Comunidades

E, mesmo assim, Sereno promete: “O bicho vai pegar no nosso dia!”

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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