Não, você não está lendo a reprodução de uma matéria antiga. Sim, o assunto é recorrente. Há anos os moradores do Vidigal reivindicam uma unidade de saúde capaz de atender ao contingente populacional. O atual Centro Municipal de Saúde Rodolpho Perissé já recebeu outras nomenclaturas implicadas à política de saúde da prefeitura vigente. O que não muda é o espaço físico, insuficiente para a quantidade de moradores vidigalenses que procuram atendimento na unidade.
Na década de 1970, o Vidigal sofreu ameaça de remoção dos barracos localizados na área do 314. Após a garantia de permanência, a população iniciou o processo de estruturação do território. Entre as construções feitas de forma coletiva, foi construída uma unidade de saúde. Em 1981, a prefeitura do Rio reestruturou o espaço e inaugurou o Posto de Saúde Rodolpho Perissé. Na ocasião, era baixa a densidade populacional no morro.
Ocorre que atualmente a população do Vidigal está estimada em 46 mil pessoas, segundo Márcio Mazola, presidente da Associação de Moradores da Vila do Vidigal (AMVV). O espaço físico e a quantidade de funcionários são insuficientes. É o que argumenta Josete Lima, presidente da ONG MMAH, ex-membro do Conselho Distrital de Saúde, moradora do Vidigal desde 1987.
“A nossa luta por um espaço de saúde que comporte o quantitativo de moradores não é de hoje. Temos uma unidade de saúde que funciona em cima de um valão e ainda falam que o Vidigal é favela chique”, desabafa Josete.
O projeto Favela-Bairro (1996) já previa essa ampliação. Em 2005, o Conselheiro Relator Jair Lins Netto solicitou a mudança de local da unidade de saúde por ser fisicamente inadequada para o total populacional e por ser de difícil acesso para as ambulâncias. Várias outras solicitações foram encaminhadas aos órgãos competentes.
Dando um salto para a década seguinte, em 2016, foi enviado à Secretaria Municipal de Saúde um requerimento de informações a respeito da construção de uma clínica da família no Vidigal. Na ocasião, o secretário de saúde era Daniel Soranz, o mesmo que assume a pasta atualmente.
Durante todo esse tempo, o argumento mais usado pela prefeitura é a ausência de um espaço físico adequado no Vidigal para a construção de uma clínica da família. Lideranças locais já apontaram possíveis lugares para construí-la. Por exemplo, em um terreno próximo à Escola Municipal Almirante Tamandaré, ou em outro terreno da prefeitura, vizinho à Escola Municipal Djalma Maranhão, na Avenida Niemeyer. A prefeitura não demonstrou interesse. Uma mansão na mesma avenida também foi sondada para se transformar em unidade de saúde para a população vidigalense. A prefeitura não concordou com o valor cobrado pelos proprietários. Atualmente o imóvel é um resort para cães. O Conselho Distrital de Saúde indicou um prédio localizado na Estrada do Vidigal. Mas engenheiros da própria prefeitura afirmaram que o local não tem estabilidade suficiente para a construção de uma clínica da família.
Para Miriam Esperança, comerciante, moradora do Vidigal há 50 anos, falta comprometimento por parte daqueles que têm por obrigação a garantia da saúde pública.
“Vereadores, que querem votos, vêm aqui e fazem ações pequenas no morro, mas não compram a briga pela construção da clínica da família. Daniel Soranz é deputado federal, mas é médico. Fez um juramento e deveria arcar com as suas responsabilidades. O Ministério Público deveria chamá-lo para conversar. É isso que eu acho que deveria acontecer. A verdade é que se a saúde pública no município fosse boa, os funcionários da prefeitura não teriam plano de saúde”, relata Miriam Esperança.
Carla Alves, mãe atípica de uma menina autista, embora reconheça os esforços dos funcionários do CSM Rodolpho Perissé, reclama da dificuldade que encontra para a realização dos exames e consultas que sua filha necessita.
“Precisamos de uma clínica à altura do Vidigal. Precisamos de neurologistas, psicólogos e um monte de coisas para os nossos filhos. A estrutura do posto não suporta. Precisamos de uma clínica da família” afirma Carla.
Em outubro do ano passado, um prédio residencial de sete andares, localizado na rua Dr. Olinto Magalhães, foi alvo da Secretaria Municipal de Ordem Pública (Seop). A construção foi embargada por não estar em acordo com a legislação em vigor.
No mesmo mês, o prefeito Eduardo Paes assinou o decreto 53.287, que dispõe sobre o uso de edificações irregulares como equipamentos urbanos para a prestação de serviços, preferencialmente ligados à promoção dos direitos fundamentais de educação e saúde.
Em seguida, a prefeitura anunciou que tal edificação seria a primeira a cumprir o determinado pelo decreto, sendo transformada em clínica da família. Porém, para que isso aconteça, são necessárias vistorias e análise técnica sobre a integridade do imóvel. Segundo Mazola, as vistorias ocorrem, mas ainda não foi definida uma data para o início das obras.
“O que acontece hoje são visitas de engenheiros e arquitetos da prefeitura que vêm periodicamente fazer vistoria. A associação, através da nossa diretora social e conselheira distrital de saúde Elaine, vem acompanhando e reivindicando a transparência e atualizações junto à prefeitura, diretamente com o administrador da GEO-Lagoa, junto ao subprefeito Sérgio Vale e também cobrando do nosso secretário Daniel Soranz. Queremos que a prefeitura nos dê uma data para o início das obras. Sabemos que este é um ano eleitoral e especulações acontecem. Não queremos ficar mais uma vez para trás. Nós precisamos, necessitamos e é um direito nosso, da comunidade do Vidigal, receber a clínica da família que o prefeito anunciou e nos prometeu”, pontua Mazola.
A equipe do Voz das Comunidades entrou em contato com a Secretaria Municipal de Saúde solicitando os dados preliminares sobre a possibilidade da construção da clínica da família no prédio embargado e a data prevista para o início das obras, caso sejam possíveis. Até o fechamento desta edição não obtivemos respostas.