“Se ‘mobilização entre os crias’ fosse um dos itens considerados no índice, eu tenho certeza que o Jacarezinho estaria entre os líderes positivamente”, pontuou Julio Aguiar, do Cria de Favela, ONG localizada no Jacarezinho, favela da Zona Norte do Rio que ocupa o 147° lugar de 158 posições no Índice de Progresso Social (IPS), divulgada pelo Instituto Pereira Passos (IPP).
A pesquisa mede o desenvolvimento a partir de três parâmetros: necessidades humanas básicas, fundamentos do bem-estar e oportunidades. São 158 bairros analisados no ranking de qualidade de vida criado pela Prefeitura do Rio. Os dez primeiros bairros estão localizados na Zona Sul do Rio, com exceção do primeiro lugar, ocupado pela Barra da Tijuca, bairro nobre da Zona Oeste. Em último lugar, está a Cidade Nova, na Zona Central, e o Jacarezinho se encontra entre os 12 últimos bairros dessa lista.
Uma das favelas-alvo da política do governador reeleito Cláudio Castro, o Jacarezinho recebeu há pouco mais de 1 ano o Programa Cidade Integrada, que nas palavras de Castro, levaria ”oportunidades e segurança pública” para a população do território. Na prática, levou mais terror e violência, além de prejudicar a economia local e interromper diversos projetos sociais.
No contrafluxo, está o que Julio chamou de “mobilização entre os crias” e, nesse movimento há não só o Cria de Favela, como também o LabJaca, o JCRE Facilitador, entre muitos outros agentes mobilizadores que fazem o que o Estado não faz: correm pela dignidade e melhoria da favela.
Com a palavra, a ONG Cria de Favela
Para Diego Aguiar, da ONG Cria de Favela, o resultado do IPS “só mantém explícita uma realidade muito conhecida, um conjunto de problemas crônicos, resultado de anos e anos de oportunidades não aproveitadas pelo poder público, que tornam a favela um caso cada vez mais complexo de problemas urbanísticos, que pioram a cada gestão e podem se tornar irreversíveis”.
Diego chama a atenção para alguns dos problemas que fazem parte do cotidiano. “Acompanhei a dor e os traumas de pessoas que têm suas vidas paralisadas durante incursões policiais e até hoje acompanho e atuo nas emergências climáticas no território que, constantemente, causam grandes perdas para uma parcela dos moradores da favela, que perdem muito durante as enchentes. Além disso, temos uma das maiores, ou talvez a maior, taxa de doenças respiratórias da cidade”.
Erica Amaral, psicóloga e integrante da ONG, explica como o resultado e a temática da saúde mental se conectam: “Somos seres integrados, a saúde mental sempre é afetada quando falamos de desenvolvimento. Principalmente da perspectiva de renda, educação e saúde. Infelizmente a população ainda não tem acesso adequado aos serviços de atendimento, poucos profissionais que não dão conta da demanda. Por isso estamos articulando com os próprios profissionais de saúde mental para atender a população e minimizar esses impactos, através de atendimentos individuais e ações em grupo. Importante ressaltar que esses profissionais são da própria comunidade, ou já foram da comunidade”.
Julio Aguiar contou um pouco sobre como o Cria de Favela trabalha para amenizar os impactos de um Estado ausente – ou presente negativamente: “Nós organizamos e realizamos ações de mapeamento e integração de pessoas de diversas áreas profissionais e tivemos uma ótima experiência recente ao organizar o primeiro Encontro de Rede do Jaca, começando pelos profissionais de Psicologia, por exemplo, todos crias do Jacarezinho, e teremos sessões assim para motivar a formação de uma rede bem diversa e potente com Crias de diferentes áreas, que vão fortalecer nossa atuação em inúmeros eixos”.
“Alguns de nossos projetos residentes, como o Jaca Cozinha e o Psis do Cria, por exemplo, já estão em operação impactando o território e muitas frentes de trabalho estão engatilhadas e previstas para serem desenvolvidas nos próximos meses, além de trabalhos em conjunto com outras instituições referência, que vão potencializar o impacto do trabalho gerado por todos”, finalizou Julio.